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Césio 137

13 de Setembro de 2017 às 11:24
Crédito: Carlos Costa
Césio 137
Audiência Pública - 30 Anos do Césio 137
Assembleia Legislativa promove audiência pública para lembrar os 30 anos do maior acidente em área urbana do mundo. Ao abrir o evento, o deputado Helio de Sousa pediu um minuto de silêncio pelas vítimas.

Diversos eventos estão ocorrendo no Estado de Goiás no mês de setembro para lembrar os 30 anos do maior acidente radiológico em área urbana do mundo. Alguns deles ocorrem aqui na Alego, como uma exposição fotográfica e uma audiência pública que aconteceu na manhã desta quarta-feira, 13, no auditório Costa Lima da Casa de Leis.

A iniciativa do debate partiu do deputado e apoiador da causa das vítimas do Césio-137, Helio de Sousa (PSDB), juntamente com o diretor de Assuntos Institucionais, Frederico Nascimento.

Helio de Sousa marcou a abertura do evento pedindo para que os participantes fizessem um minuto de silêncio em respeito e homenagem às vítimas da tragédia do Césio-137.

Em sua fala, o parlamentar ressaltou a importância de não se esquecer da tragédia. “Não podemos deixar que fique no esquecimento algo que foi tão traumático na vida de milhares de goianos. Nós já temos trabalhado essa questão nos últimos anos, pequenos avanços já aconteceram”, contou.

O deputado disse que é preciso provocar o debate para que o Estado tome atitudes. “Temos que provocar o debate. O Estado não age, ele reage. Por isso, temos que provocar o Estado para que ele faça justiça”, ressaltou.

Helio de Sousa explica que os radioacidentados do extinto Consórcio Rodoviário Intermunicipal (Crisa) são discriminados na questão econômica, pois eles recebem valores inferiores que outras categorias que participaram da descontaminação de Goiânia.

“Os soldados que estiveram no campo de batalha foram os servidores do Crisa. Eles tiveram que colocar a mão na massa, muitas vezes, sem a segurança necessária. Portanto, não tenho dúvida, eles são os heróis da descontaminação de Goiânia”, ressaltou.

O parlamentar afirmou que alguns avanços já estão ocorrendo para que seja feita justiça para as vítimas da contaminação. “Já tivemos várias audiências com membros do Governo do Estado sobre essa questão. Tratamos diretamente com o Governador Marconi Perillo e alguns avanços já aconteceram, mas precisamos de mais”.

Por fim, ele assegurou que no Gabinete Civil está em tramitação uma agenda positiva para os radioacidentados. “Para que nós possamos aumentar as oportunidades, principalmente naquilo que é vital que é uma pensão digna para todos aqueles que contribuíram com a descontaminação de Goiânia ou que foram vítimas desse processo radioativo”.

 

“Esse acidente foi resultado de uma política nuclear mal conduzida”

Durante o debate que tratou sobre o acidente nuclear que ocorreu em Goiânia no dia 13 de setembro de 1987, o coordenador do Fórum Permanente sobre o Acidente com Césio-137, professor Júlio de Oliveira Nascimento, enfatizou que o problema está na falta de preparo dos responsáveis pela energia nuclear no Brasil.

“A Comissão Nacional de Energia Nuclear foi a principal culpada quando não retirou a tempo a cápsula que foi encontrada no Instituto Goiano de Radiologia em 1987. Tudo começou a partir de um mal funcionamento da Política Nuclear”, disse.

Ele diz que o problema no Brasil é a falta de preparo e isso pode ocasionar outros acidentes. “Como tudo é mal feito aqui, nós corremos o risco de repetir esse acidente. Goiânia hoje é o símbolo, é o aviso para o Brasil e para o mundo de coisas que não devem ser feitas”, afirmou Júlio.

Júlio Nascimento ainda ressaltou a falta de respaldo do Estado para com as vítimas da tragédia. “Não foi feito um devido atendimento à saúde das vítimas e o devido ressarcimento econômico sobre aquilo que eles sofreram. Isso não aconteceu a contento, é parcial. Eles não recebem remédio, não se sentem acolhidos. A qualidade de vida deles foi se deteriorando por força da inépcia do Estado”, enfatizou.

Ele lembrou o caso de Fukushima no Japão e disse que mesmo com diversos cuidados há riscos eminentes e, para ele, o Brasil não toma os devidos cuidados, por isso os riscos aumentam de forma considerável. “Mesmo que você tenha todos os cuidados nós não conhecemos, não sabemos com o que estamos lidando. Goiânia sofreu essas consequências”.

Para Júlio, essa discussão não é apenas sobre o passado, pois as consequências da tragédia reverberam até hoje. “Goiânia tem que ser discutida pela sociedade goiana, pelo Brasil e pelo mundo. Todos nós temos que nos apropriar dessa discussão. Pois não se trata apenas de um problema do passado. O acidente de Goiânia ainda repercute hoje na saúde das vítimas que vão ser afetas até a terceira geração e temos o depósito de Abadia que vai ficar ali perigosamente por mais 270 anos”. 

 

Vítimas do Césio-137

Sebastião Vaz da Silva, 65 anos, era motorista do CRISA, e foi um dos operários que trabalharam diretamente na coleta do material contaminado pelo Césio-137. Para o motorista, a falta de preparo e falta de instrução, foram os principais fatores que tornaram o acidente do Césio-137 o segundo maior do mundo.

“Eu mesmo pisei na rua 57 com caminhão sem saber o que estava acontecendo. Vestindo minha roupa normal de trabalho durante 8 dias. Após esses dias que veio à tona o acontecido, aí nos deram umas meias de tecido. Aí nós calçamos isso e continuamos a trabalhar. Dias depois nos deram uns macacões e assim foi o nosso trabalho lá”, conta o motorista.

De acordo com Sebastião, além da falta de conhecimento, não existiam equipamentos de proteção para os trabalhadores que estavam na linha de frente do processo de descontaminação.

“Foi muito dolorido para todos nós funcionários do CRISA que trabalhamos em toda a retirada do material radioativo e vimos de perto o que aconteceu. Eu como motorista de caminhão fui um dos primeiros a entrar lá e ainda sem saber o que acontecia”, explica o ex-funcionário do CRISA.

O motorista ainda conta que recebe duas pensões por conta dos seus esforços junto a Justiça, porém lamenta que estão defasadas, sendo a Estadual baseada no salário mínimo de 2015. Já a Federal, Sebastião explica que recebe desde o final do ano passado. Ele ainda lamenta a perda de vários colegas que trabalharam no processo de descontaminação.

“Nós vimos os sintomas que estacam acontecendo, colegas falecendo e muitos doentes. Eu recebo as minhas pensões por força da justiça, em 2014 foi reconhecida a Estadual e no final de 2016 a Federal, tudo por força da justiça. Hoje, aqui, você pode contar nos dedos as pessoas que estão aqui da nossa equipe do CRISA. A maioria não consegue vir por conta dos problemas de saúde”, relata emocionado.

Para o ex-servidor, o Governo precisa se sensibilizar com a causa e conceder benefícios justos, pois “recebemos uma pensão desde 2015 de um salário mínimo, que não dá para pagar os remédios”, encerra Sebastião Vaz da Silva.

Já para Antonio de Abreu Caldeira, 71 anos, que era integrante do departamento de compras do CRISA e atual vice-presidente da Associação dos Contaminados, Irradiados e Expostos ao Césio 137 (ACIEC), esta data de 13 de setembro, além de marcar a sua vida, se trata de uma data para relembrar com indignação o que aconteceu na época do acidente radioativo.

“O principal problema na época foi a falta de cuidado dos governantes. Foi uma falta de responsabilidade muito grande também deixar uma peça daquela abandonada, onde qualquer um teria acesso”, evidencia o vice-presidente da ACIEC.

Antonio de Abreu ainda explica que não recebe apoio por parte do Governo Federal e que aguarda os trâmites de processos em Brasília. Já relacionado ao aporte do Estado, Antonio conta que recebe um salário mínimo, sem reajuste desde 2015, no valor de R$ 788,00 e o plano de saúde do IPASGO.

“Pela União nós não temos nenhum apoio, por enquanto, mas temos processos tramitando em Brasília. Pelo Estado o único apoio que nós temos é o plano de saúde do IPASGO. Nós ganhamos um salário mínimo de 2015 como benefício”, explica.

O vice-presidente da ACIEC ressalta que tenta chamar a atenção do Poder Público, no sentido de viabilizar melhorias na assistência às vítimas do Césio-137. Caldeira ainda mostra que o problema de todos, além da falta saúde, se trata dos valores dos medicamentos que são de uso contínuo.

“Estamos na luta para chamar a atenção dos políticos para nos ajudar na assistência médica e nos remédios, que são muito caros e não temos condições para manter os tratamentos. Meus remédios custam R$1.258,00 por mês. Não posso ficar um dia sequer sem tomar esses remédios, e como eu existem muitas pessoas assim. Um salário mínimo não é suficiente”, declara o vice-presidente da Associação.

O representante ainda explica que muitos sofrem com problemas cardíacos, renais e pulmonares. Outros são acometidos por câncer, depressão e síndrome do Pânico. Ele ainda ressalta, que por falta de atenção do Poder Público, outros acidentes similares podem acontecer, pois não há trabalhos de prevenção e preparo no Estado.

“Pode acontecer novamente, os riscos estão aí. Goiás não está preparado para lidar com outra situação dessa e nunca vai ficar preparado. Porque as coisas dependem muito dos governantes e eles não tem o menor interesse. Podem fazer igual fizeram com a gente, disseram que era um vazamento de gás e nos jogaram lá para combater o perigo. Você pode ver que a maior parte das pessoas que trabalharam lá já morreu”, declara o vice-presidente da ACIEC, Antonio de Abreu Caldeira.

 

Deliberações

Ao final da reunião, foi deliberado buscar um reajuste no valor da pensão das vítimas, pois está defasada. Ainda é calculado com base no salário mínimo de 2015, ou seja, são R$ 788,00. Também pediram um acompanhamento dos serviços prestados pelo Ipasgo e por fim, mais atenção do Governador para com as pessoas acometidas pela tragédia.

O deputado Helio de Sousa afirmou que encaminhará um ofício com as deliberações ao Governador de Goiás, Marconi Perillo. 

 

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