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Seguindo avanços no País, Goiás amplia políticas que valorizam o parto humanizado

21 de Janeiro de 2019 às 12:34

No último dia 20, domingo, o Brasil celebrou, pelo quarto ano consecutivo, o Dia Nacional da Parteira Tradicional. A data foi instituída mediante a promulgação da Lei Federal nº 13.100, de 27 de janeiro de 2015. Nela, presta-se o justo reconhecimento a uma categoria ainda pouco valorizada, mas que pode ser considerada como precursora da obstetrícia médica.

Isto porque, até início do século passado, eram elas as únicas responsáveis por assistir as mulheres em seus trabalhos de parto. Nesta época, o chamado “parto industrializado” (aquele que é, via de regra, assistido por equipes médicas em hospitais e envolve medicalização e intervenções cirúrgicas, como a cesariana) ainda não havia sido disseminado. Ele viria a se tornar o modelo dominante, em substituição ao parto natural, apenas a partir da Segunda Guerra Mundial.  

Nem por isso, as parteiras tradicionais deixariam de exercer, no entanto, os seus ofícios. Eles continuam a ser sistematicamente requisitados, até os dias de hoje, sobretudo nas áreas rurais de regiões remotas, onde a estrutura e capilaridade do sistema de saúde é ainda, como um todo, bastante deficitária e onde aproximadamente 20% dos nascimentos são realizados em ambiente domiciliar.

Estima-se que, atualmente, cerca de 60 mil mulheres prestem esse tipo de serviço, em todo o país. Juntas elas são responsáveis por assistir, anualmente, em média, 450 mil partos. Isto é o que informava projeto apresentado pela senadora Rose de Freitas (Podemos/ES) ao Congresso Nacional, em 2004. Na época, ela integrava o então PMDB capixaba.

“A data determinada para o Dia da Parteira Tradicional homenageia o Estado do Amapá, exemplo quase isolado de atenção pública qualificada às parteiras tradicionais. Daquele estado, celebra o 20 de janeiro de 1908, data de nascimento da mais antiga parteira de Macapá, Sra. Juliana Magave de Souza, hoje com 96 anos, comentou Freitas, na ocasião. Segundo dados informados pela parlamentar, a parteira amapaense teria ajudado, até então, 339 crianças a virem ao mundo, todas frutos de partos naturais.

Doulas

Em Goiás, legislações similares têm buscado reconhecer igualmente o trabalho de pessoas, notadamente mulheres, que dedicam suas vidas a garantir às futuras mães uma gestação mais sadia e um parto mais humanizado. Um exemplo é a Lei nº 20.072, sancionada em maio passado. Ela obriga maternidades, casas de parto e estabelecimentos hospitalares congêneres, da rede pública e privada do Estado de Goiás, a admitirem a presença das chamadas doulas durante todo o período de trabalho de parto, sempre que estas forem solicitadas pelas parturientes.

Ao prestar o devido apoio físico e emocional às gestantes, as doulas acabam por atenuar muitos transtornos sofridos na hora do parto. É o que defende a deputada Isaura Lemos (PCdoB), em projeto que deu origem à legislação estadual em questão. Sua defesa faz coro a posições adotadas por instituições oficiais, como a Organização Mundial de Saúde e o próprio Ministério da Saúde.

“A presença de doulas têm demonstrado que o parto evolui com mais tranquilidade e rapidez e com menos dor e complicações, tanto maternas como fetais, tornando-se uma experiência gratificante, fortalecedora da vinculação entre mãe e bebê. As vantagens também ocorrem para o sistema de saúde, que, além de oferecer um serviço de maior qualidade, tem uma significativa redução de custos, dada a diminuição das intervenções médicas e do tempo de internação das mães e dos bebês”, sublinhou Isaura em texto que justificava o projeto.

O documento cita ainda outros dados que ilustram os demais benefícios gerados por esse tipo de assistência. Além de oferecer alívio natural nas dores das contrações, o trabalho das doulas também podem reduzir em cerca de 17% a necessidade de qualquer tipo de analgesia; em 31%, a necessidade de ocitocina sintética; e em 28%, a de cesariana, dentre outras vantagens.

Mesmo a despeito de todos esses argumentos aparentemente favoráveis, o tema em questão continua a dividir profissionais da área, notadamente médicos. Inclusive o próprio Governo Estadual, manifestou-se contrário à medida, vetando à matéria. O projeto só foi, no entanto, convertido em lei, após o Plenário da Alego derrubar tal veto, por 24 votos a 3. A votação se deu no dia 25 de abril passado.

O deputado Helio de Sousa (PSDB) esteve entre os três que votaram contra a aprovação da proposta. Segundo ele, seu posicionamento reflete opinião de parte da classe médica, que reivindica a responsabilidade total sobre o parto. Por outro lado, seu colega de profissão, o deputado Dr. Antônio (DEM), disse ser favorável à matéria, uma vez que a adoção da medida contribuiria para humanizar o atendimento à parturiente.

Os deputados Major Araújo (PRP) e Francisco Jr (PSD) também se manifestaram favoráveis ao pleito de Isaura. Na ocasião, eles disseram concordar com a justificativa apresentada pela deputada e reconheceram, igualmente, o apoio moral e psicológico trazido pela atuação dessas profissionais.

Combate à violência obstétrica

Noutro aspecto, tais medidas podem contribuir ainda para a redução dos casos reconhecidos como violência obstétrica. O termo define os atos de violência verbal, física e psicológica praticados por profissionais de instituições de saúde contra as mulheres gestantes, em trabalho de parto, estado puerperal, em situação de abortamento ou de morte fetal.

Questões relacionadas ao combate à violência obstétrica foram debatidas durante audiência pública realizada em abril passado, na sede da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego). O evento foi conduzido pelo presidente da Comissão da Criança e Adolescente, deputado Carlos Antonio (PTB). Dentre os desdobramentos, foi posto em tramitação, na Casa, o projeto de lei nº 2267/18, de autoria do próprio parlamentar, e que aguarda agora primeira votação em Plenário.  

Ao propor modificações na Política Estadual de Prevenção à Violência Obstétrica no Estado de Goiás (Lei nº 19.790/17), o projeto visa instituir novos direitos às gestantes, dentro os quais também se inserem as permissões para o acompanhamento por doulas. A proposta delimita, no entanto, o universo preciso nos quais elas devem atuar, trabalho que não deve se confundir jamais com aquele que é exercido pelos médicos, enfermeiros e demais técnicos obstetras.

“Elas (as doulas) deverão dar apoio emocional, físico e até afetivo para a gestante e seu companheiro (a), ajudando a mulher a lidar com a dor, medo e expectativas. Para isso, as doulas utilizam-se de técnicas de massagens para aliviar as dores na contração e orientam as posições que podem dar mais conforto às mulheres na hora do parto”, explica o deputado ao justificar a proposta.

Parto humanizado

As legislações e projetos citados ao longo dessa matéria marcam importantes passos rumo à instituição de modelos mais plurais e humanizados de atendimento à gestante, quebrando monopólios e vícios já arraigados à assistência obstétrica convencional. Procedimentos como estes, que tem o foco na própria gestante, já são uma realidade consolidada em sistemas públicos de saúde de alguns países europeus, como a Holanda e a Inglaterra, por exemplo.

Apesar de todas as políticas anunciadas, ainda falta muito para que o Brasil venha a se tornar uma referência em parto humanizado. E o fato de o país liderar atualmente o ranking das cesáreas no mundo destaca-se como um dos principais fatores. Os números revelam que mais da metade dos 2,9 milhões de partos anuais (55%) são cirúrgicos.

Na rede pública, eles representam 40% dos nascimentos e na privada, 84%. Isso é o que apontam os dados divulgados pelo Ministério da Saúde, em 2014. Os números extrapolam, portanto, com folga, a própria porcentagem recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo ela a ocorrência de cesáreas não deveria superar a casa dos 15%, visto que esse procedimento só é indicado em casos emergenciais, onde há riscos à vida da gestante e do bebê.

No mais, por regra, o parto normal é o que deveria dominar as estatísticas e ser, portanto, incentivado pelo sistema de saúde, visto que contribui para a redução da mortalidade materna e neonatal e da violência obstétrica. Salvo nos casos de a gravidez ser considerada de risco, a opção por uma modalidade ou outra, no entanto, segue sendo de livre escolha da gestante.

 

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