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Notícias dos Gabinetes
Complexidade do desafio da transformação social

08 de Abril de 2009 às 11:16
Artigo do deputado Ozair José (PP) publicado no jornal Diário da Manhã, edição de 07.04.2009. Imprimir

* Ozair José é o líder da bancada do PP na Assembleia Legislativa 


Os programas oficiais e das ONGs encaram o problema da exclusão de modo parcial, privilegiando ora a geração de renda (bolsa de escola, cesta básica, etc), ora a questão de emprego via frentes de trabalho, particularmente no Nordeste, flagelado pelas secas recorrentes. Nenhum desses programas atinge o objetivo de inclusão social no sentido mais lato e profundo da palavra, por omitir a dimensão central do fenômeno - a perda de autoestima e de identidade de pertencer a um grupo social organizado.

A inclusão torna-se viável somente quando, através da participação em ações coletivas, os excluídos são capazes de recuperar sua dignidade e conseguem - além de emprego e renda - acesso à moradia decente, facilidades culturais e serviços sociais, como educação e saúde.

Essa tarefa ultrapassa o âmbito estreito dos programas de filantropia e exige o engajamento contínuo do poder público através de políticas pro-ativas e preventivas, sobretudo na área econômica, em nível federal, que permeiem as ações dos governos estaduais e municipais.

As políticas ao nível macro executadas pelas diversas instâncias do poder público não devem ser concebidas como competitivas ou substitutivas dos programas e projetos realizados pelas ONGs e outras entidades da sociedade civil. Ambos são necessários e complementares à condição de que não haja cooptação ou aproveitamento dos programas desenvolvidos para fins político-partidários.

Em retrospectiva, nas últimas décadas, percebe-se o avanço gradual da sociedade civil nas disputas sobre sua admissão nas esferas de decisão, inclusive com a alocação de recursos dos orçamentos governamentais.

Assim é possível prever um longo período de poder dual em que as autoridades e instituições tradicionais procurem manter o status quo na defesa dos interesses das classes proprietárias e da tecnocracia a elas aliada. Por outro lado, as múltiplas organizações da sociedade civil, adquirindo saber e experiência no manejo e na defesa das causas públicas, conquistam maior autonomia e autoconfiança na sua capacidade de gerir o próprio destino no processo de transformação social e política.

Tradicionalmente os cientistas sociais têm se dividido em três correntes quanto às prescrições para uma intervenção transformadora das estruturas sociais. No início do século XX, predominava a corrente marxista-revolucionária que preconizava a tomada de poder mediante a insurreição armada. Cem anos depois, com o desmoronamento da União Soviética e o fracasso do “socialismo em um país só”, computados os custos sociais da coletivização forçada e dos estragos ambientais da “industrialização de choque”, impõe-se uma revisão crítica do conceito e suas aplicações, sobretudo à luz das transformações profundas das estruturas econômicas e políticas no mundo e, particularmente, na América Latina.

Outro grupo, de tendência mais reformista e avesso à mobilização de movimentos sociais, preconiza a mudança social pela educação das massas para que possam se beneficiar das oportunidades de mobilidade social ascendente. Em que pese a conjuntura econômica desfavorável e a própria dinâmica “perversa” da acumulação e reprodução do capital, fica evidente o caráter ilusório desta proposta, sobretudo quando apresentada de modo descolado da evolução do mercado de trabalho, do progresso técnico e de uma visão mais integrada sobre o futuro “desejável” da sociedade.

Uma terceira proposta que tem conquistado adesões, nos últimos tempos, privilegia o sistema de tributação progressiva, particularmente as operações financeiras de natureza especulativa. Enquanto, nos países ricos, uma alíquota de 50% ou mais de Imposto de Renda é considerada normal, no Brasil, continuamos atados aos 27,5%, mesmo depois de muitos debates no Congresso. Ressuscitou-se a Taxa Tobin (uma espécie de CPMF), cobrada sobre transações financeiras internacionais, cujos rendimentos serviriam para financiar projetos de desenvolvimento nos países mais pobres e problemáticos. Esta proposta, tal como a anterior, esbarra na questão do poder, na capacidade e vontade do Estado em absorver as pressões da sociedade para implantar um regime de tributação e distribuição mais equitativo dos recursos públicos.

Diante da complexidade do desafio de transformação social e a multiplicidade de fatores intervenientes, não existe uma solução única e milagrosa. O processo de construção de uma sociedade democrática universal, apesar dos avanços indubitáveis já realizados, será longo e árduo devido às resistências das forças autoritárias e conservadoras em cada uma das sociedades nacionais e na estrutura de poder internacional.

Como enfrentar as condições estruturais adversas da economia que levam à exclusão social, vedando aos pobres o acesso ao mercado de trabalho, à moradia decente e aos serviços coletivos de saúde, educação e lazer?

Um número crescente de administrações municipais tem logrado melhoramentos no atendimento da demanda mediante a integração de vários programas que visam ao resgate da dívida social.

Em termos concretos, torna-se fundamental:

Ampliar e fortalecer os canais de participação social, apostando no contínuo esforço dos excluídos para prosseguir na construção de uma sociedade que reconheça seu direito a ter direitos - os direitos humanos em toda sua plenitude - civis, políticos e sociais;

Investir fortemente na qualificação e emancipação dos movimentos sociais, ONGs e de outros setores da sociedade civil para que desenvolvam ações propositivas e capazes de fazê-los participar eficazmente de negociações e deliberações;

Qualificar agentes governamentais em todos os níveis a fim de transmitir e fortalecer neles uma cultura democrática, participativa e solidária;

Capacitar lideranças para implementar políticas inovadoras quanto à melhoria das condições de vida de toda a população e à democratização dos processos de trabalho e de gestão;

Inspirar e potencializar ações políticas institucionais em todos os setores da sociedade, para difundir práticas democráticas ampliadoras da cidadania.



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