Debate da Comissão de Saúde trata de ações voltadas à conscientização e tratamento da puberdade precoce
A Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (Alego) realizou, na manhã desta terça-feira, 25, audiência pública para discutir aspectos relevantes sobre a conscientização da puberdade precoce. O evento teve lugar na sala das comissões do Palácio Maguito Vilela e contou, na programação, com um ciclo de palestras ministrado por especialistas e profissionais da área.
A iniciativa evento teve como propósito o levantamento de informações e relatos para a fundamentação de projeto de lei que visa à criação de data especial para a conscientização do tema. A matéria, de autoria do presidente do colegiado, deputado Gustavo Sebba (PSDB), está prevista para ser apresentada na sessão plenária da tarde de hoje.
A mesa de trabalhos foi composta pela professora e mestre em educação em ciências e matemática, Sandra Regina Ricci, que ministrou palestra sobre o papel da escola e dos professores na identificação da puberdade precoce. Junto a ela, estava também a farmacêutica especialista em saúde pública, auditora em serviços de saúde e professora da Faculdade Anhanguera, Ana Paula Giácomo, que falou sobre a jornada do paciente no tratamento da puberdade precoce: do primeiro atendimento médico até a aplicação e acompanhamento do paciente.
A composição contou, ainda, com participação remota da médica interina e gerente da farmacêutica Adium, Luciana Guedes, que ministrou palestra sobre diagnóstico e tratamento da enfermidade. A gerente de acesso da farmacêutica Adium, Milayne Elias do Nascimento Pereira, também compôs na mesa e apresentou um projeto piloto para a conscientização sobre o tema.
A íntegra da audiência está disponível no canal do YouTube da TV Assembelai e pode ser assistida neste link.
Diagnóstico e tratamento
A condição é caracterizada pelo início antecipado das mudanças físicas da puberdade e acontece antes dos oito anos, nas meninas, e dos nove, nos meninos. Esse fenômeno pode causar diversos desafios físicos e emocionais, tanto para as crianças quanto para suas famílias. Entre os sintomas mais comuns estão o desenvolvimento mamário, o crescimento dos pelos pubianos e o rápido crescimento em altura.
As meninas são as mais acometidas pelo quadro. Nelas, a disfunção pode envolver também a chegada precoce da menstruação e da maturidade sexual. Nos meninos, pode vir associada também ao crescimento dos testículos.
A entrada na fase fértil caracteriza a fisiologia regular da vida adulta e sua antecipação, durante a infância, pode trazer vários transtornos físicos, psicológicos e sociais. Dados históricos comprovam que essa condição de precocidade vem se agravando e afetando cada vez mais crianças, nos últimos dois séculos.
As informações integraram a palestra ministrada pela médica Luciana Guedes. Ela explicou que a condição não possui causa conhecida e pode estar associada a vários fatores, envolvendo desde questões nutricionais e genéticas ao ambiente psicológico e socioeconômico em que a criança é criada. "Trata-se de uma disfunção que compreende um conjunto de mudanças fisiológicas, bioquímicas, físicas e endócrinas”.
O diagnóstico pode ser feito por exames laboratoriais e de imagem. Caso não tratada, a disfunção pode gerar comprometimento de estatura, problemas emocionais e comportamentais significativos, além de sofrimento por culpa, insegurança, medo, perda de senso de identidade, estresse e comportamentos de risco. “São crianças que não estão prontas para serem adultos", alertou.
Guedes informou que o tratamento, que se encontra disponível de forma gratuita na rede pública, via Sistema Único de Saúde (SUS), visa a diminuir a velocidade do crescimento e regular os níveis hormonais a valores fisiológicos esperados. Ele envolve o uso de medicamentos e acompanhamento psicoterapêutico, podendo contar com o direcionamento dado por endocrinologista, neurologista, pediatra e profissionais que trabalham com a saúde da família.
A médica chamou atenção para a importância da educação nesse contexto. "A educação é ponto chave. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é uma pérola para esse processo, por identificar as crianças como sujeitos de direito".
Ela pontuou que a observação do comportamento das crianças em idade de acompanhamento escolar é fundamental e que sinais de alerta envolvem dificuldade de integração, isolamento social, baixa autoestima e aceitação corporal e estresse. A obesidade infantil também pode ser um fator associado.
Por fim, a especialista apresentou pesquisas dos EUA que mostram a relação do quadro com situações de abusos em meninas. "No nosso País, esse é um tema de extrema importância, especialmente para a escola pública", arrematou.
Gravidez precoce
A gravidez precoce pode ser considerada uma das consequências mais complicadas da puberdade precoce. O quadro é ainda mais complexo porque, normalmente, expõe, conforme citado, crimes, muitas vezes velados, de violência sexual contra crianças.
A situação foi abordada Milayne Elias do Nascimento Pereira, durante a apresentação do projeto piloto "Um Olhar para Infância - Puberdade Precoce". O caso vivenciado pela peruana Lina Medina, em 1939, foi ilustrado como motivação para a iniciativa.
A menina Lina foi considerada a mãe mais jovem da história, tendo dado à luz aos cinco anos de idade. Suspeitas de abuso foram levantadas, mas as circunstâncias que levaram à gestação precoce, assim como a identidade do pai da criança, nunca foram reveladas.
O diagnóstico de puberdade precoce já era conhecido à época. No caso de Lina, exames identificaram a ocorrência de primeira menstruação aos oito meses e ciclos menstruais regulares a partir dos 3 anos. A formação mamária se constituiu aos quatro e, aos cinco, a largura de quadril e a idade óssea da menina já eram compatíveis com a de uma mulher adulta.
“Trata-se de um tema muito relevante para a sociedade. Nós que atuamos na área de acesso temos um papel muito importante que é o de garantir que o paciente receba não apenas o medicamento, mas todo o cuidado na integralização da saúde. Isso inclui educação e informação para que a população conheça um pouco mais sobre essa doença, que tem tratamento gratuito. Essa é a missão do projeto, atuar em prol da saúde e do bem-estar das nossas crianças”, defendeu Pereira.
A gerente revelou que existem, atualmente, no Brasil, cerca de 40 mil crianças sendo tratadas com puberdade precoce. “O que aconteceu em 1939 não é uma doença rara. Infelizmente, essas crianças que se desenvolvem fisicamente antes do tempo podem e tendem a ser alvos de abusos. Nós escolhemos Goiânia para ser a primeira cidade a receber esse projeto piloto, que visa a integralizar a comunidade escolar nesse processo de conscientização. O principal objetivo é contribuir com a rede pública, por meio de ações de prevenção, promoção e atenção à saúde ”, arrematou.