Impactos dos agrotóxicos
A deputada estadual Bia de Lima (PT) promoveu, nesta quarta-feira, 27, audiência pública para debater os “Impactos dos Agrotóxicos em Goiás”, o evento foi realizado no auditório 2, da Assembleia Legislativa de Goiás.
Além da parlamentar compuseram à mesa de trabalhos a coordenadora da Comissão Pastoral da Terra em Goiás (CPT), Leila Lemos; pesquisadora em Saúde Pública da Fiocruz do Ceará, Fernanda Savicki; professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), Miller Caldas Barradas; coordenador da Vigilância Ambiental e Saúde do Trabalhador da Secretária de Estado da Saúde, Magno Pereira Lima; chefe da Divisão de Articulação do Ministério do Desenvolvimento Agrário, Rodrigo Gonçalves de Souza; coordenadora da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, Jakeline Pivado; representante da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura Familiar do Estado de Goiás (Fetraf), Antônio Chagas.
Bia de Lima em sua fala, trouxe uma importante reflexão sobre o papel do poder público e a urgência de enfrentar o problema dos agrotóxicos no Estado. “O Cerrado é essencial para a vida de milhões de pessoas. Não podemos permitir que o lucro do agronegócio continue sendo priorizado em detrimento da saúde das famílias e da preservação ambiental. Precisamos agir com responsabilidade, com políticas públicas que fiscalizem o uso de agrotóxicos e, principalmente, ofereçam alternativas sustentáveis para a agricultura”, afirmou.
A parlamentar também destacou o impacto direto sobre os agricultores familiares, que frequentemente sofrem com a pulverização de produtos químicos próximos às suas casas e cultivos. “Essas comunidades estão sendo envenenadas lentamente, e o mais grave é que muitas vezes sequer têm acesso a informações sobre os riscos que estão correndo. É nosso dever como legisladores ouvir essas pessoas e transformar essas denúncias em ações concretas para protegê-las”, pontuou.
“Este evento é um marco para mostrarmos que é possível mudar a realidade. Estamos aqui para unir forças e construir um futuro mais justo e saudável para o Cerrado e para todas as pessoas que dependem dele”, concluiu.
Impactos na Saúde
A pesquisadora Fernanda Savicki, da Fiocruz, apresentou dados alarmantes de um estudo realizado em sete estados que compõem o Cerrado. Foram detectados 13 princípios ativos de agrotóxicos nas amostras de água, sendo cinco deles encontrados em Goiás. Desses, dois estão proibidos na União Europeia, e um apresentou concentrações 28 vezes superiores aos limites permitidos em outros países.
“A situação é alarmante. Quando a água está contaminada, as pessoas também estão contaminadas, seja pelo consumo, seja pelo contato no uso diário. Isso se torna um problema de saúde pública de proporções gigantescas”, alertou Fernanda.
Os efeitos dos agrotóxicos na saúde incluem doenças graves como câncer, problemas de tireoide, infertilidade e má formação fetal. “As intoxicações crônicas, que são silenciosas, causam danos que só aparecem ao longo do tempo, dificultando o diagnóstico e o tratamento. É uma situação que demanda atenção urgente”, explicou Fernanda.
A coordenadora da Comissão Pastoral da Terra em Goiás (CPT), Leila Lemos, destacou a necessidade de articulação entre entidades, enquanto Jaqueline Privado reforçou a importância de ações conjuntas para combater o uso indiscriminado de agrotóxicos. Antônio Chagas, por sua vez, deu voz às preocupações dos agricultores familiares: “A contaminação das águas não é um problema isolado. Estamos falando de córregos e açudes que servem a muitas comunidades. Isso afeta diretamente nossa produção, nossa saúde e nosso modo de viver”.
Alerta
O coordenador da Vigilância Ambiental e Saúde do Trabalhador, Magno Pereira Lima, trouxe reflexões importantes sobre a responsabilidade compartilhada no combate aos agrotóxicos. Ele destacou o papel da vigilância em saúde por meio de programas como o Vigiar, que identifica e prioriza áreas no Brasil, onde atividades econômicas ou sociais podem expor mais a população aos poluentes do ar e o Vigiagua, que monitora a contaminação da água e do solo, além do Vigipec, que se dedica à análise de produtos químicos prioritários, incluindo os agrotóxicos. O principal objetivo desses programas é proteger a saúde das pessoas expostas a esses poluentes.
Magno compartilhou uma experiência vivida há três anos, quando recebeu uma solicitação de análise de água de um município próximo a Goiânia, suspeito de contaminação por agrotóxicos após períodos de chuva. “A contaminação não é responsabilidade apenas do setor da saúde. Precisamos de ações conjuntas, das secretarias de meio ambiente, de uma maior fiscalização nas propriedades rurais do Estado e da proteção das matas ciliares. É um problema que exige um esforço de todos ”, disse.
O coordenador também destacou a necessidade de atualizar a legislação ambiental, lembrando que as leis atuais foram estabelecidas há décadas, quando as condições climáticas e de uso do solo eram diferentes. “Será que os 20% de reserva legal previstos para o Cerrado são suficientes hoje? A ciência já mostrou que não, e precisamos revisar isso com urgência para garantir a preservação dos recursos hídricos e a estabilidade climática”, conclui.
Impactos
O representante da Universidade Federal de Goiás (UFG), Miller Caldas Barradas apresentou dados sobre os efeitos desses produtos químicos na saúde humana e no meio ambiente e ressaltou o trabalho desenvolvido pelo laboratório, coordenado pela professora Daniela Eliza, que foca no biomonitoramento da contaminação ambiental e de trabalhadores expostos. “Estamos analisando as consequências da exposição direta e indireta aos agrotóxicos, principalmente em populações rurais. Nosso objetivo é levar as pesquisas para todo o Estado de Goiás, mas esbarramos em limitações de recursos e infraestrutura”, afirmou.
Miller destacou estudos realizados em diversos municípios de Goiás, como Silvânia, Jataí e Rio Verde. Os dados apresentados mostraram que 40,9% dos trabalhadores expostos utilizavam glifosato, seguido por inseticidas e fungicidas; 58,3% dos entrevistados não usavam Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), fator que aumenta significativamente o risco de intoxicação; Entre os trabalhadores que não utilizavam EPIs, 6 casos de intoxicação direta foram confirmados.
Pesquisas também indicaram alterações imunológicas e danos ao DNA em agricultores expostos, apontando para um aumento no risco de doenças graves, como o câncer. Miller mencionou o trabalho da pesquisadora Thais, que encontrou relação entre a exposição prolongada a agrotóxicos e o desenvolvimento de linfomas, leucemias e outros tipos de câncer em trabalhadores rurais.
Um dos pontos mais preocupantes apresentados por Caldas foi a identificação do uso contínuo de agrotóxicos proibidos há décadas, como o inseticida DDT, proibido no Brasil desde 1985. “Apesar das restrições legais, alguns produtos ainda são encontrados em propriedades rurais. Isso mostra a necessidade de fiscalização mais rígida e eficiente”, pontuou.
Caldas reforçou a importância de iniciativas intersetoriais para enfrentar os impactos dos agrotóxicos. Ele destacou que o Brasil é o maior consumidor mundial desses produtos e que entre 2002 e 2019, foram registrados mais de 2.801 novos agrotóxicos no País. “A legislação atual não acompanha o avanço da utilização desenfreada desses químicos. Precisamos de uma revisão urgente para garantir a saúde das populações rurais e urbanas”.
Por fim, Miller Caldas destacou a necessidade de fortalecer a fiscalização e regulamentação do uso de agrotóxicos, com foco em produtos proibidos; investir em pesquisas científicas e infraestrutura laboratorial para ampliar o monitoramento dos impactos ambientais e à saúde; promover a educação e conscientização sobre o uso de EPIs e os riscos da exposição direta e indireta; criar políticas públicas integradas para reduzir a dependência de agrotóxicos e incentivar práticas agrícolas sustentáveis.