Ícone alego digital Ícone alego digital

Precauções com o fogo

06 de Junho de 2025 às 10:00
Precauções com o fogo

Os riscos aumentam muito nesse período do ano com as festas juninas. Na Alego, tramita projeto para instituir programas de apoio psicológico, reabilitação e reintegração social para vítimas de queimaduras e suas famílias.

São recorrentes as histórias de pessoas que tiveram suas vidas impactadas por acidentes domésticos que marcaram seus corpos e suas almas. São pessoas que passaram pela dor e dificuldade na recuperação após acidentes dolorosos envolvendo fogo, choques elétricos ou queimaduras químicas. Pequenos momentos que mudaram para sempre a história de muitas vidas. Por conta dessa realidade, o calendário de datas comemorativas é marcado pelo 6 de junho, Dia Nacional de Luta Contra Queimaduras. 

A data foi instituída pela Lei 12.026 em 2009, com o intuito de sensibilizar a população e promover a conscientização sobre a importância da prevenção, do tratamento e atitudes necessárias para os primeiros socorros.

A queimadura é uma lesão grave, de alta prevalência na infância e adolescência. É considerada um problema de saúde pública e pode provocar traumas potencialmente graves com alterações estéticas e funcionais, além de transtornos emocionais e sociais, que comprometem a qualidade de vida e a dinâmica familiar. Nos casos mais graves, a queimadura pode levar à morte. 

No mundo inteiro, os dados indicam que todos os anos acontecem 260 mil mortes por ano, sendo que aproximadamente 90% ocorre em países de baixo índice de desenvolvimento socioeconômico. Somente no Brasil, devem ocorrer por ano cerca de 1 milhão de casos de acidentes por queimadura e, destes, são internadas cerca de 150 mil pessoas, sendo 30% crianças.

De acordo com dados divulgados pela Revista Brasileira de Queimaduras, o custo do tratamento por paciente pode ultrapassar R$ 1,5 mil por dia, em uma unidade de tratamento específica. Dentre os pacientes internados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no ano de 2000, 4,4% das internações foram devido à queimadura, enquanto o número de óbitos atingiu 2.500 casos. A publicação indica que as queimaduras são causadas por diversos fatores, como contato com líquidos aquecidos, produtos químicos, corrente elétrica, radiação e até mesmo animais e plantas.

Normalmente os acidentes acontecem dentro de casa, por descuido, nas diversas atividades corriqueiras, e os mais comuns são aqueles com álcool líquido ou produtos como thinner, diesel, querosene, gasolina, perfume, óleo e água quente.

Junho também é um período onde aumenta a preocupação com os acidentes que podem provocar queimaduras devido ao aumento do contato com bebidas aquecidas, fogueiras e fogos de artifício. 

Campanha 2025

Neste ano de 2025, compreendendo a importância do seu papel, a Sociedade Brasileira de Queimaduras (SBQ) protagonizou sua campanha anual voltada para as mulheres vítimas de violência de gênero. Essa pauta foi colocada em destaque devido ao aumento constante no número de casos, ocasiões em que elas são brutalmente submetidas a queimaduras pelos seus parceiros, em situações que impossibilitam completamente sua defesa. Na grande maioria, esses ditos “parceiros” jogam álcool no corpo dessas mulheres e ateiam fogo.

Com o tema “Marcas no Corpo, Feridas na Alma”, a campanha da SBQ pretende sensibilizar a sociedade para os diversos casos de vítimas de feminicídio ou tentativa de feminicídio, nas quais o fogo ou substâncias corrosivas, como o ácido, foram utilizados como meios de agressão extrema à mulher e às pessoas transexuais. Apesar disso, as notificações desses casos em unidades de saúde são reduzidas.

Em uma de suas publicações, o Cadernos FioCruz expôs o sofrimento dessas mulheres queimadas, entendendo que as metáforas emergentes são carregadas de significância cultural da “monstruosidade” e da violência de gênero pelo fogo – inscrita impiedosamente no corpo feminino.

O efeito dessa agressão resulta nessas mulheres danos irreparáveis, desencadeando não apenas uma urgência médica, mas sérios problemas físicos, psicológicos e financeiros para elas, para suas famílias e para a sociedade. Na grande maioria desses casos, especialmente naqueles em que a queimadura afeta as áreas do corpo com maior exposição, ocorre uma alteração na imagem corporal e na identidade.

No cenário brasileiro, a referida publicação alerta que esse tipo de incidente com queimadura é um problema fortemente relacionado ao sistema patriarcal, em que as relações assimétricas, o machismo e a violência de gênero estão enraizados e inscritos no panorama sociocultural, onde diversas mulheres enfrentam agressividades diariamente, colaborando para o crescimento da injúria - crime que consiste em ofender a honra subjetiva de uma pessoa, atacando sua dignidade ou decoro. 

Uma vítima na linha de frente

Vítima dessa violência de gênero, a ex-vereadora por Goiânia e atual secretária de Projetos Especiais da Procuradoria da Mulher da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), Cristina Lopes, em recente entrevista à Agência de Notícias da Casa de Leis, lembrou que é autora da Lei Municipal 10.040, de 14 de junho de 2017. Essa lei instituiu o “Junho Laranja” no calendário oficial da capital goiana. 

Olhando para a sua própria história, quando ainda no início da juventude foi vítima de tentativa de feminicídio por meio de combustão e teve mais de 80% do corpo atingido, a secretária afirmou que “a queimadura é o maior trauma que o corpo humano é capaz de suportar”. Pela sua percepção, esses são casos que desafiam os médicos, pois alteram drasticamente toda a fisiologia do paciente, exigindo um tipo de atendimento altamente especializado.

Ela relata que depois deste incidente pessoal resolveu se dedicar, por meio da fisioterapia, ao atendimento de pessoas que enfrentaram casos semelhantes. Especializada em queimadura, ela foi a primeira profissional da fisioterapia no Brasil a entrar para a Sociedade Brasileira de Queimaduras.

Experiente, Cristina Lopes explica que o paciente que enfrenta esse quadro de queimadura extensa, necessita de longo período de um atendimento com equipe multidisciplinar composta por: cirurgião plástico, dermatologista, psicólogo, enfermeiro, fisioterapeuta, dentista e assistente social.

“No decorrer dos anos, apesar de muitas evoluções, o atendimento aos pacientes queimados permanece como um grande desafio de saúde pública em nosso país. A falta de centros de queimaduras regionais, de uma rede integrada de atendimento, a escassez de profissionais de saúde adequadamente treinados, a indisponibilidade de recursos como curativos modernos, malhas elásticas e equipamentos cirúrgicos, o abandono no segmento de pacientes com sequelas, que não conseguem reinserção social, são alguns exemplos das dificuldades que ainda existem no Brasil”, destaca a gestora de Projetos Especiais da Procuradoria da Mulher. 

Considerando esse cenário, ela adverte que, durante as festas juninas, celebradas em todo o país como um evento do calendário cultural, toda a sociedade deve adotar medidas preventivas no sentido de evitar acidentes por queimaduras, muito comuns nessa época do ano, especialmente com fogos de artifícios, fogueiras, bebidas quentes, frituras, dentre outros.

“Doutora Cristina”, como é mais conhecida, conclama para que as festas juninas sejam somente um tempo de alegria onde reinam as comidas típicas, os trajes, as danças, as quadrilhas, as fogueiras, os ambientes coloridos com bandeirolas. Ela solicita que as crianças sejam protegidas e mantidas em segurança, mas, caso ocorra algum incidente, que a região afetada seja lavada com água fria (nunca colocar gelo), coberta por um tecido limpo e, imediatamente, a vítima seja encaminhada para hospital especializado. 

Por fim, a fisioterapeuta relata que, em todo o estado de Goiás, existem poucos centros de referência habilitados em atender queimaduras (somente em Goiânia e Anápolis). São eles: o Hospital Estadual de Urgências Governador Otávio Lage de Siqueira (Hugol); o Pronto Socorro para Queimaduras do Grupo Piccolo; e o Hospital de Queimaduras em Anápolis. Para os casos de queimaduras causadas por acidentes de moto ou carro, o mais recomendado é o Hospital dos Acidentados, na capital. 

Projeto na Alego

Presidente da Comissão de Saúde do Parlamento goiano, o deputado Gustavo Sebba (PSDB), sabendo que a Casa deve cumprir com seu papel de caixa de ressonância social, apresentou o projeto de lei 863/24, que busca instituir programas de apoio psicológico, reabilitação e reintegração social para vítimas de queimaduras e suas famílias, promovendo uma recuperação integral e digna. 

No bojo do projeto, o texto defende que o atendimento psicológico individual e em grupo bem como as terapias ocupacionais e atividades de integração social são fundamentais para promover a saúde mental e emocional das vítimas. Enfatiza ainda que a implementação de programas de apoio psicológico em hospitais especializados garantirá que as vítimas recebam o suporte necessário desde o início do tratamento. 

O legislador explica que a reabilitação física é crucial para a recuperação das funções motoras e para a melhoria da qualidade de vida das vítimas de queimaduras. Portanto, as sessões de fisioterapia e terapia ocupacional são essenciais para a recuperação das habilidades funcionais, enquanto o acompanhamento médico especializado contínuo é necessário para o tratamento das sequelas físicas. 

O parlamentar entende que as consequências dessas lesões podem ser devastadoras, afetando a autoestima, a capacidade funcional e a qualidade de vida das pessoas atingidas. “As queimaduras podem causar traumas psicológicos profundos, incluindo depressão, ansiedade e transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). O apoio psicológico contínuo e especializado é essencial para ajudar as vítimas e suas famílias a lidar com o trauma e a readaptação à vida cotidiana.” 

O tucano pontua que o acesso a tratamentos avançados, como cirurgias plásticas reparadoras e enxertos de pele, são procedimentos necessários para que as vítimas recuperem sua aparência e funcionalidade, contribuindo para a sua autoestima e bem-estar.

Reintegração

“A reintegração social das vítimas de queimaduras é um aspecto vital para garantir que essas pessoas possam viver de forma digna e produtiva. Programas educacionais e de capacitação profissional, adaptados às necessidades das vítimas de queimaduras, são essenciais para promover a inclusão e a igualdade de oportunidades”, diz Sebba. 

Ele observa, ainda, que essas pessoas devem garantir a continuidade dos seus estudos por meio de programas de educação à distância e parcerias com instituições de ensino para a concessão de bolsas de estudo para que se desenvolvam academicamente e profissionalmente, aumentando suas chances de inserção no mercado de trabalho, apesar do grande impacto da queimadura em suas vidas.

Por fim, o legislador assegura que a prevenção é a melhor forma de reduzir a incidência de queimaduras. Ele destaca que as campanhas de conscientização pública sobre a importância da prevenção de queimaduras e do apoio às vítimas são fundamentais para promover uma cultura de segurança e sensibilizar a sociedade sobre a gravidade desse problema. “A conscientização é uma ferramenta poderosa para prevenir acidentes e salvar vidas.”

A propositura do tucano já passou pela Comissão de Constituição, Justiça e Redação e foi encaminhada para a Comissão de Saúde, onde aguarda relatoria do deputado Antônio Gomide (PT). 

Agência Assembleia de Notícias - Reportagem: Ana Cristina
Compartilhar

Nós usamos cookies para melhorar sua experiência de navegação no portal. Ao utilizar você concorda com a política de monitoramento de cookies. Para ter mais informações sobre como isso é feito, acesse nossa política de privacidade. Se você concorda, clique em ESTOU CIENTE.