Meio ambiente e economia

No Parlamento goiano tramitam propostas efetivas para que o Estado tenha benefícios ambientais e ao mesmo tempo ganhe ativos econômicos com o mercado de carbono, tema que será prioridade na pauta da COP30.
Regulamentado nacionalmente desde o final do ano passado, o mercado de carbono encontra eco em ações e projetos da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (Alego) e está cada vez mais em pauta com a proximidade da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025, a COP30, de 10 a 21 de novembro em Belém, no Pará.
Fala-se em mercado de carbono há seis décadas, mas ele só ganhou forma em anos recentes. Em 1997, o Protocolo de Quioto trouxe a possibilidade de países com emissões reduzidas venderem créditos de carbono a países mais poluidores.
Em 2015, o Acordo de Paris previu, no art. 6º, acordos bilaterais de comércio de carbono e um sistema administrado pela Organização das Nações Unidas (ONU) para que países e empresas compensassem emissões de carbono e negociassem as compensações.
Em 2024, na COP29, em Baku, no Azerbaijão, tópicos em suspenso do art. 6º foram resolvidos, viabilizando a implementação, com regras claras, de um mercado global de carbono. Na COP30, o tema deve ser tratado com recortes mais específicos, como a proposta brasileira de se criar, com diversos países, uma Coalização para Integração de Mercados de Carbono.
A regulamentação nacional ocorreu com a lei no 15.042, de 11 de dezembro de 2024. O mercado de carbono brasileiro deve ser implementado em cinco etapas.
Um crédito de carbono é obtido por medidas como reflorestamento de áreas degradadas ou substituição de uma fonte de energia suja por uma limpa. Cada unidade de crédito de carbono equivale a uma tonelada de gás carbônico (CO2) que deixou de ser emitida por uma empresa ou país. Quando há uma redução de emissão de outros gases, como metano e óxido nitroso, é feita uma conversão para se chegar à quantidade do gás reduzido que corresponde a uma tonelada de CO2.
Ativos econômicos
“Hoje falamos de dois ambientes para a negociação de créditos de carbono: o mercado regulado e o mercado voluntário”, explica a deputada Rosângela Rezende (Agir), que na Alego coordena a Frente Parlamentar em Defesa da Transição Climática Justa e Promoção dos Créditos de Carbono como Solução Sustentável, criada em abril de 2025.
A legisladora detalha que "o mercado regulado será vinculado ao Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa, o SBCE [criado pela lei 15.042], que está sendo estruturado pelo Governo Federal em fases ao longo de seis anos. Nele, empresas que não conseguem reduzir emissões por tecnologia poderão comprar cotas de emissão e certificados de redução ou remoção verificada (CRVEs) para compensar sua pegada de carbono”.
“Já o mercado voluntário”, prossegue, “opera fora do sistema regulado, mas seguirá regras semelhantes: os créditos só poderão ser gerados mediante comprovação da efetiva redução ou remoção de carbono e deverão ser registrados no SBCE para transparência. Aqui entram projetos de preservação, reflorestamento e tecnologias de captura de gases de efeito estufa”.
Para Goiás isso significa, na prática, transformar nossas práticas de conservação em ativos econômicos. "O Estado pode gerar títulos a partir de ações como recomposição, manutenção e conservação de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e reservas legais; implementação de planos de manejo em unidades de conservação; assentamentos de reforma agrária que adotem boas práticas ambientais.”
Rosângela Rezende participou da Conferência das Partes e estará na COP30 tentando levar Goiás ao centro do debate climático. Segundo ela, o que for discutido em Belém irá reverberar aqui porque “estamos falando de transição energética, manejo sustentável, bioeconomia e novas tecnologias para ampliar a produção com menor impacto ambiental”.
Financiando políticas públicas
A parlamentar pontua que Goiás precisa conciliar a produção agrícola com a preservação dos recursos naturais. O mercado de carbono, em especial, é uma chance de atrair investimentos, gerar renda e posicionar o Estado como referência em desenvolvimento sustentável.
Projeto do deputado Jamil Calife (PP) que tramita na Alego busca justamente gerar renda com esse mercado. A proposição autoriza o Executivo a comercializar créditos de carbono oriundos de florestas e faixas de domínio das rodovias estaduais (processo no 707/25).
“Atualmente, o principal ativo que o Estado possui e não explora por falta de norma autorizadora é o mercado de crédito de carbono”, assevera Calife na matéria, especificando ser possível obter R$ 2,75 bilhões de receita, resultante da certificação de 6,77 milhões de créditos de carbono a US$ 74 cada um, na cotação de meados de 2025. Esse total considera a quantidade de florestas de propriedade de Goiás e faixas de domínio das rodovias estaduais.
O deputado diz que é preciso que uma receita assim relevante seja vinculada a programas e políticas de Estado, para que o recurso seja convertido em investimentos de cunho geracional. Para isso, considera importante que os recursos sejam investimentos em três eixos básicos: duplicação de rodovias, implantação de hidrovias e implantação de usinas fotovoltaicas que garantam sustentabilidade da máquina pública.
Jamil Calife frisa ainda não haver incompatibilidade orçamentária e financeira na proposta porque ela não provocará redução de receita; antes, ao contrário, a incrementará.
Mercado de carbono goiano
Em 2023, dois deputados propuseram regulamentar o mercado de carbono em Goiás: Bia de Lima (PT) apresentou o projeto no 1177/23, que, além de regulamentar esse mercado, estabelece medidas para a redução das emissões de gases de efeito estufa, e Lineu Olimpio (MDB) assina o projeto no 6077/23, que, além de dispor sobre a regulamentação do mercado de créditos de carbono estadual, institui o programa de créditos de carbono "Ecogoiás".
Bia de Lima escreve em sua proposição que o Estado de Goiás possui um potencial significativo para gerar créditos de carbono devido às suas características geográficas e ao seu extenso território. Com uma extensa área de Cerrado e recursos naturais abundantes, como nascentes e vegetação nativa, Goiás tem a capacidade de desenvolver projetos de redução de emissões, principalmente na agricultura, pecuária e energia renovável.
Lineu Olimpio sustenta que a regulamentação do mercado de créditos de carbono e a criação do programa "Eco Goiás" não se limitam a uma resposta à crise climática, representando também uma oportunidade para o desenvolvimento sustentável e econômico do Estado, atraindo investimentos e talentos e conscientizando a respeito das mudanças climáticas.
Os projetos de Bia de Lima e de Lineu Olimpio prosperaram na Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJ) e tramitam agora na Comissão de Meio Ambiente e Recursos Hídricos.
Secretaria de Mudanças Climáticas
Nas propostas, os dois parlamentares atribuem à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) a responsabilidade de gerir o mercado de carbono. Em requerimento (no 19589/24), Paulo Cezar (PL) inclusive propõe, em caráter de urgência e preferência, que Goiás crie uma secretaria executiva das mudanças climáticas (Seclima).
“A criação da respectiva secretaria executiva, a que o Estado de São Paulo já aderiu, terá por finalidade inserir a variável climática, a mudança do clima e a melhoria da gestão dos recursos ambientais nos processos decisórios do governo”, argumenta o deputado, enfatizando que não seriam criados gastos porque o Executivo poderia remanejar servidores.
O que o governo goiano tem, sob controle da Semad, é a Gerência de Mudanças Climáticas e Serviços Ecossistêmicos (Gecli), cujas iniciativas estão detalhadas aqui.
Ligado ao mercado de carbono, Goiás tem um decreto de 2021 que institui um plano setorial para adaptação à mudança do clima e à baixa emissão de carbono na agropecuária, com alterações em 2025.
Outro texto é a lei no 21.767, de 2 de janeiro de 2023, originária de projeto do deputado Virmondes Cruvinel (UB). Ela institui a Política Estadual do Hidrogênio Verde, que objetiva reduzir a emissão de carbono e ampliar a matriz energética no Estado de Goiás.
Paulo Cezar lamenta, de todo modo, a não criação da Seclima. “As mudanças climáticas já são visíveis a olhos nus”, afirma. “Ou nos preparamos, ou os custos de mitigação ambiental serão monstruosos. A ciência mostra que esse é um caminho sem volta. Perdemos a hora de fazer mudanças, e o que temos agora é de nos prepararmos para as grandes catástrofes: ondas de calor, incêndios, chuvas torrenciais em curto espaço de tempo, enchentes, alagamentos”.
Goiás, diz Paulo Cezar, será um dos estados mais atingidos com as mudanças climáticas: “Corremos o risco de termos uma queda vertiginosa na produção [agropecuária], devido a secas mais rigorosas, com crise hídrica. Precisamos preparar nossas bacias, cuidar das nascentes e apostar em programas de reflorestamento e na agroecologia”.