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Audiência pública promovida pela deputada Bia de Lima revela uso abusivo de agrotóxicos em Goiás
Audiência pública promovida na manhã desta quarta-feira, 27, pela deputada estadual Bia de Lima (PT), na Assembleia Legislativa de Goiás, discutiu os “Impactos dos Agrotóxicos em Goiás”, tendo como base o dossiê “Vivendo em territórios contaminados: um dossiê sobre agrotóxicos nas águas do Cerrado” produzido a partir de estudo sobre o uso de defensivos no Cerrado e os efeitos causados nos territórios e na população.
O levantamento, de iniciativa da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida e realizado em parceria com a Comissão Pastoral da Terra (CPT/GO) e a Fiocruz foi realizado a partir de análise toxicológica de amostras de água coletadas em comunidades localizadas na região conhecida como Matopiba, e em Goiás, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, no final de 2022, identificou que, “nas sete comunidades participantes da pesquisa-ação em que houve coleta de água, foram identificados, ao todo, 13 agrotóxicos diferentes”, todos autorizados para utilização na lavoura de soja, mas 50% deles não têm uso autorizados na União Europeia.
Na abertura do evento, Bia de Lima falou sobre a importância de debater o tema. "Muito importante trazer esse tema à tona para que possamos não só conhecer a situação gravíssima do quanto Goiás está nessa estatística de utilização extremamente elevada de agrotóxicos, como também discutir como teremos produtividade sem o uso excessivo desses agentes que são muito perigosos para a saúde dos homens, dos animais e do meio ambiente", disse.
Em Goiás, o estudo foi realizado em dois ciclos, 2021 e 2022, no acampamento Leonir Orback, em Santa Helena, ocupado há oito anos e onde vivem cerca de 200 famílias, que sobrevivem da agricultura familiar. Fazendo fronteira com monoculturas de soja e milho, a água consumida pelos acampados é, em grande parte, proveniente de uma lagoa localizada nas proximidades já contaminada pelo agrotóxico utilizado nas lavouras, inclusive por pulverização aérea.
De acordo com o estudo, são cinco os agrotóxicos encontrados em Goiás: etofenprox, glifosato, 2,4-D, 28 (vezes superior ao valor máximo permitido na legislação da União Europeia), atrazina e fipronil (que não têm autorização de uso na União Europeia).
Segundo a pesquisadora Fernanda Savicki, coordenadora do estudo pela Fiocruz, no primeiro ciclo, o 2,4-D foi encontrado em 12,50% das amostras coletadas, no segundo, o valor aumentou para 75%. O fipronil não foi detectado no primeiro ciclo, mas no segundo apareceu em 100% das amostras.
"É importante dizer que não é só nas áreas de agricultura familiar, quando falamos da água, ela não se restringe a um território único, estamos falando da circulação dessas substâncias para outros lugares, inclusive para as cidades, entendendo que os córregos, que os mananciais criam bacias que abastecem os grandes centros", alertou Savicki.
O estudo detectou que os acampados do Leonir Orback sofrem com a contaminação da água e o agrotóxico espalhado pelo ar com a pulverização do agente nas lavouras. Segundo a coordenadora Nilva Machado Costa já houve registros de “mortes por câncer, problemas respiratório e de pele, diarreia e cólicas", mas a pesquisa cita ainda dores de cabeça, cegueira, infecções urinárias, intestinais e hepática, ansiedade, manchas pulmonares e falta de ar.
Militante do Movimento Sem Terra e coordenadora da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, articulação da sociedade civil que idealizou o estudo, Jakeline Pivado iniciou sua fala dizendo "agrotóxico é um tema pesado, que não traz nada de informação boa nunca, todos os espaços que a gente vai para falar de agrotóxico é só para receber informação ruim, toda pesquisa que se dedica a estudar agrotóxico não encontra nada bom".
Pivado apresentou números alarmantes de fontes diversas sobre o uso de agrotóxicos no país. O glifosato, que tem alto potencial cancerígeno e associado a 503 mortes de crianças por ano, é o mais vendido no Brasil, segundo o estudo Down the River: Glyphosate Use in Agriculture and Birth Outcomes of Surrounding Populations. The Review of Economic Studeies - Dias, Rocha e Soares (2023).
Dados da Anvisa/Ibama/EU Pesticide Database Sonia Hess mostram que 56% dos agrotóxicos usados no Brasil são proibidos ou não têm registro na União Europeia.
E, de acordo com o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg), em 2022, mais de 1 milhão de toneladas de agrotóxicos foi utilizada no Brasil e 89% dos agentes têm uso apenas nas lavouras de soja, milho, algodão, pastagens e cana-de-açúcar.
"Agrotóxico é um tema pesado, que não traz nada de informação boa nunca, todos os espaços que a gente vai para falar de agrotóxico é só para receber informação ruim, toda pesquisa que se dedica para estudar agrotóxico não encontra nada bom", afirmou.
"O agrotóxico foi pensado numa lógica de destruição de biodiversidade, de monocultivo, de transformação da produção de alimento em commodities, passando a ser tratado como mercadoria para disputa de força e de poder, de disputa de território e expulsão das comunidades, não tem uma coisa vantajosa", concluiu Jakeline Pivado.
O pesquisador da Universidade Federal de Goiás, Miller Caldas Barradas apresentou uma pesquisa realizada com a também pesquisadora Andreya Gonçalves Costa, em Goiânia, Silvânia, Rio Verde, Jataí, Goianésia, Itapuranga e Formosa, entre 2010 e 2021, e registrou 1.453 prontuários, sendo 89% do sexo masculino.
De acordo com o estudo, 37 indivíduos do grupo exposto (20,6%) relataram intoxicação aguda; cem (87 homens e 13 mulheres) eram indivíduos expostos diretamente a agrotóxicos; 80 sujeitos (38 homens e 42 mulheres) foram ambientalmente expostos a agrotóxicos. As lavouras de soja (48%) e de milho (34%) foram as mais atingidas pelos agentes e o glifosato foi o principal agrotóxico utilizado.
Vários trabalhadores registraram denúncias de utilização de produto químico em acampamentos. Rubens, do Acampamanto Ribeirão Jaraguá de Aragarças, criador de abelhas e produtor de hortaliças e legumes, denunciou o impacto do agrotóxico no território e a perda de enxames pelo uso dos produtos químicos. "A nossa produção é para consumo e poucas vendas, o veneno chegou mesmo para detonar", revelou.
Tonho da Caiapônia disse que é preciso reagir ao uso dos agrotóxicos e que só a formação será capaz de mudar o cenário. "O maior problema que nós temos é a formação e acreditar que podemos mudar. Precisamos levar junto à campanha contra o veneno, a resposta da agroecologia", propôs.
Já Hebert, do MST, parabenizou a deputada pelo encontro e sugeriu que "para além do debate sobre o uso de agrotóxico, seja realização debate sobre o projeto e o modelo de agricultura para o país".
Fernanda Savicki, da Fiocruz, deixou proposta de ação, aprovação de leis de proibição de pulverização aérea e de proteção ambiental mais rígidas; estabelecimento de territórios livres de agrotóxicos e transgênicos; monitoramentos da qualidade ambiental relacionada aos agrotóxicos – VSPEA; iniciativas intersetoriais de saúde, meio ambiente, educação e outras participativas e colaborativas com as pessoas do acampamento; promoção de atividades de formação e sensibilização dos profissionais de saúde do SUS, preferencialmente dos territórios mais expostos.
Finalizando a audiência pública, a deputada Bia de Lima colocou o mandato à disposição para trabalhar a causa a partir de campanha de esclarecimento sobre os malefícios do uso dos agrotóxicos. “Quero que saibam que o Gabinete 13 está a serviço dessas pautas tão importantes para nós, mulheres do campo, homens, crianças e juventude para que possamos conseguir deslanchar a Campanha contra o Agrotóxico e pela Vida, e também para avançarmos na reforma agrária para que vocês possam plantar, morar e viver com dignidade e perspectiva", afirmou.
Participaram ainda da audiência pública a coordenadora da Comissão Pastoral da Terra Goiás Leila Lemes; o Coordenador de Vigilância Ambiental e Saúde do Trabalhador da Secretaria Estadual de Saúde de Goiás Magno Pereira Lima; e o Chefe de Divisão de Articulação do Ministério do Desenvolvimento Agrário Rodrigo Gonçalves de Sousa.