Prevenção à trombose
A data foi instituída por lei nacional, sancionada em 2012, e chama a atenção para a conscientização sobre a doença, que, segundo estimativas do Ministério da Saúde, atinge, por ano, duas a cada mil pessoas. No Estado, lei de iniciativa da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) implementou uma campanha de conscientização quanto ao risco de trombose por mulheres que fazem uso de anticoncepcional e portadoras do gene do trombofilia.
Em 2007, quando tinha apenas 23 anos, a jornalista Ana Tereza Nassar foi parar em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) depois de sentir uma forte dor na perna, que foi tratada, inicialmente, como uma tendinite.
Ela conta que a dor era muito intensa, diferente de todas que já havia sentido e, por isso, foi a um pronto-socorro. O diagnóstico do ortopedista que a atendeu foi de que se tratava de uma tendinite e receitou um anti-inflamatório.
Isso aconteceu em uma quinta-feira. Ela começou a tomar a medicação e, no dia seguinte, não tinha mais dor. O fim de semana foi tranquilo, mas na segunda-feira, acordou sufocada com sintomas respiratórios. “Levantei da cama e vi que não conseguia respirar direito. Puxava o ar e não vinha. Dias depois, ainda com falta de ar e muita dor no peito, fui a um pneumologista”, diz Ana Tereza.
Ao ouvir o relato da dor na perna e logo depois a falta de ar, o especialista foi taxativo: “Você teve uma embolia pulmonar”.
Do consultório, a jornalista saiu direto para uma bateria de exames, que confirmaram o diagnóstico. Ela teve uma trombose na perna que subiu pela corrente sanguínea e parou na artéria que irriga o pulmão.
Os resultados dos exames assustaram até o profissional, acostumado a tratar casos da doença. “O médico explicou que foi a maior embolia pulmonar que ele tinha visto nos seis anos de experiência. E que eu não morri porque não era meu dia e porque eu era jovem”.
O tratamento incluiu quatro dias de internação na UTI e um remédio que tiraria todos os trombos, mas que também poderia causar hemorragias.
Depois da internação, mais exames para identificar o motivo da trombose. “Descobrimos que eu sou trombofílica, ou seja, tenho mais chances de ter tromboses por causa de uma mutação genética. E, na época, tinha ainda dois fatores que contribuíram ainda mais para o surgimento de uma trombose: eu tomava anticoncepcional e fumava”.
Após tomar anticoagulante por seis meses, Ana Tereza foi liberada do tratamento. O que ela não esperava era ter outro episódio de trombose. Sete anos depois, os trombos apareceram no mesentério, um órgão do corpo humano que fica no abdômen, próximo ao intestino.
Foi necessária mais uma temporada de internação e a prescrição do anticoagulante para o resto da vida.
Felizmente, hoje ela está bem, faz acompanhamento com hematologista de seis em seis meses e leva uma vida normal. “Só preciso tomar cuidado caso precise fazer algum procedimento cirúrgico ou se for fazer uma viagem com mais de três horas de duração, daí preciso fazer exercícios, me levantar, para ajudar a evitar que possa ter qualquer trombo. E dependendo da duração da viagem, preciso também tomar um medicamento”.
Foi pensando em casos como o de Ana Tereza que o deputado Talles Barreto (UB) apresentou, na Assembleia Legislativa de Goiás, um projeto de lei propondo a instituição de uma campanha de conscientização quanto ao risco de trombose por mulheres que fazem uso de anticoncepcional e são portadoras do gene da trombofilia.
Segundo a proposta, a campanha estadual deve ser desenvolvida para informar e orientar as mulheres portadoras do gene da trombofilia e que fazem uso de anticoncepcional sobre o risco de desenvolver trombose; informar as mulheres portadoras de trombofilia sobre as possíveis complicações durante a gestação e, ainda, possibilitar a reciclagem dos profissionais de saúde quanto aos avanços na prevenção e detecção precoce da trombofilia.
Em sua justificativa, o deputado cita que a Organização Mundial de Saúde orienta que as mulheres portadoras de trombofilia não devem fazer uso de anticoncepcionais orais combinados.
Além disso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em 2014, emitiu nota no mesmo sentido. De acordo com o documento da Anvisa, quando uma mulher com trombofilia começa a fazer uso de anticoncepcionais, o risco de sofrer uma trombose passa de oito(oito) para 30 (trinta) vezes.
Barreto lembra ainda das mulheres que, sem saber que têm o gene da trombofilia, fumam e fazem uso de anticoncepcional, fatores que aumentam a possiblidade de desenvolver a doença, já que a nicotina e o hormônio associados modificam o sangue, facilitando a formação de coágulo. Foi o que aconteceu com Ana Tereza.
“Assim, cabe enfatizar que não se pode generalizar, ou seja, não são todas as mulheres que fazem uso de anticoncepcional que vão desenvolver trombose. Mas, sem dúvida, quem fuma e usa pílula tem mais chance, ante a modificação do sangue em virtude da associação da nicotina e do hormônio, facilitando a formação de coágulo”.
A proposta foi chancelada pela Casa e virou a Lei nº 19.117, sancionada pelo então governador Marconi Perillo.
A doença
Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular – Goiás, Juliano Santos, existem duas formas de trombose, que são bem diferentes uma da outra.
O médico explica que a trombose arterial é causada, geralmente, por placas de gordura que se acumulam no interior dos vasos, obstruindo aos poucos o tecido, podendo chegar até à obstrução total, a chamada oclusão.
Esse processo leva à falta de sangue no tecido ou em qualquer órgão do corpo. “Ela pode ser crônica, como essa das placas de gordura, como pode ser aguda, que geralmente é causada por aneurismas ou por uma arritma cardíaca, quando o ritmo alterado do coração faz o sangue ficar mais parado e liberar coágulos, que seria a embolia”, ensina o médico.
O médico também esclarece que o principal fator de risco para a trombose arterial é o tabagismo, seguido do diabetes e da hipertensão arterial.
Já a trombose venosa é caracterizada pelo inchaço das pernas, causada pela falta de atividade do membro, mesmo que por pequenos períodos, como em uma viagem mais demorada.
De acordo com Juliano Santos, a doença também acomete pacientes com câncer, fumantes e pessoas que que sofreram algum trauma corporal. O uso de hormônios também pode levar à formação de trombos. “Eles aumentam a viscosidade do sangue, ele fica mais grosso, coagula e entope a veia. O sangue que é empurrado pelo coração não consegue retornar e, assim, ele vai causar sintomas de inchaço, dor e até escurecimento do membro”.
Sintomas e consequências
Na trombose arterial, os principais sintomas são: dor intensa, palidez, diminuição da sensibilidade do membro, podendo chegar à necrose do tecido. Na doença venosa, a dor e o inchaço na perna são os principais sinais.
Segundo o profissional, a trombose, tanto arterial, quanto a venosa, podem trazer graves efeitos para o corpo, inclusive podendo levar ao óbito. “Os trombos da trombose arterial geralmente fazem a isquemia do membro ou do órgão alvo. Então, a trombose não tende a causar outras doenças, mas se, por exemplo, entope a artéria do rim, pode levar à insuficiência renal, se entope a artéria do fígado, pode levar à insuficiência hepática e suas consequências. Se entope no cérebro, pode levar a um AVC”.
No caso da doença venosa, Santos ensina que o maior risco é quando o trombo se desprende do local onde foi criado. Nesse caso, ele migra pelo sistema sanguíneo e pode chegar ao pulmão. “Chegando ao pulmão, ele pode fazer a tão temida embolia pulmonar, causando sequelas e até a perda da vida”.
O médico alerta ainda que as duas formas em que a doença se apresenta são graves e podem levar à morte, justamente por causa do entupimento de vasos vitais, como a carótida e a coronária e de órgãos vitais, levando à insuficiência desses órgãos ou evoluindo para uma sepse grave.
Prevenção e tratamento
Apesar da gravidade, os tratamentos para a trombose têm se mostrado eficazes, especialmente quando a busca por atendimento é feita rapidamente, logo que se apresentam os primeiros sintomas.
O especialista revela que na forma arterial a trombose pode ser tratada com anticoagulantes, receitados por médicos especialistas, ou com cirurgias para a retirada dos coágulos. Em casos de trombos mais antigos uma angioplastia pode ser necessária para reabrir os vasos com stents ou balões.
Os tratamentos para a trombose venosa são quase os mesmos utilizados na forma arterial, mas há casos específicos, nos quais uma cirurgia pode ser a saída. “A depender do tipo de sequelas e de sintomas apresentados, pode ser indicada uma trombectomia, que é a aspiração desses trombos com aparelhos na hemodinâmica, em cirurgias endovasculares, com muito bons resultados”.
Mas o melhor mesmo é evitar que a doença apareça. E, sim, é possível fazer a prevenção da trombose, tanto a venosa, quanto arterial. A receita para escapar dela é bem conhecida e serve para evitar a ocorrência de várias outras enfermidades: o estilo de vida saudável.
Uma boa alimentação, com baixa ingestão de carboidrato e gordura, a ingestão de uma quantidade adequada de água são hábitos que ajudam a evitar a ocorrência da trombose. E, claro, a prática de exercícios físicos. “Ela vai fazer a circulação ter uma dinâmica mais fluída, mais adequada para o sangue, evitando que ele fique parado em trombose. A prática adequada e frequente de exercícios físicos previne, praticamente, todos os tipos de trombose”.
O médico também aconselha alguns cuidados para prevenir a trombose venosa, como evitar o uso de hormônios, a exemplo dos anticoncepcionais com a substância, mas especialmente a utilização de hormônios para fins estéticos. Outra orientação é evitar longos períodos em repouso e, para os pacientes internados, principalmente em UTIs, o acompanhamento de fisioterapia, que vai ajudar na circulação periférica.
Por fim o médico faz um alerta importantíssimo para um aspecto pouco observado pela população brasileira. “A gente deve tomar muito cuidado com o que a gente ingere. Isso inclui os medicamentos. Medicamentos têm funções específicas para o tratamento de doenças. Qualquer exagero na medicação prescrita ou na automedicação pode ter sequelas, pode ter efeitos colaterais e, entre elas, a trombose”.