Darlene Liberato fala em nome das homenageadas
Prezadas senhoras,
Quero em primeiro lugar, agradecer a oportunidade de poder nesta noite representar algumas das mulheres do estado, pois só posso estar aqui, devido a existência anterior deste espaço, das idéias que o movem, da luta de tantas outras companheiras que tecem o cotidiano do movimento feminista em Goiás.
No dia de hoje, em meio a esta digna homenagem, gostaria de lembrar o que move a luta das mulheres, o que faz com que hoje tenhamos um dia internacional da mulher.
É preciso resgatar o histórico de resistência das mulheres às imposições do patriarcado, da opressão capitalista, é preciso lembrar as milhares de vidas ceifadas, como as das operarias da fabrica Coton, nos Estados Unidos, as mulheres exterminadas pelo nazismo, as que deram suas vidas pela retomada da democracia lutando contra os regimes militares, as mães da praça de maio, as muitas margaridas que perderam suas vidas lutando por um pedaço de chão, as mulheres militantes da paz, as milhares de vitimas da exploração sexual, do abandono, as mulheres fatalmente atingidas pela violência doméstica.
Vou abrir espaço para falar do Cevam.
O Cevam é um abrigo de mulheres. O único do Centro Oeste. Muros altos, as vezes com soldados à porta, varias mulheres refugiadas com prole à volta, privadas de liberdade, foragidas da violência de seus maridos, espancadas, queimadas, estupradas, torturadas que aqui exilam, pois se retornarem ao lar, serão vitimas de violência ainda maior.
Infelizmente varias são as mazelas que batem dia e noite na nossa porta, enfrentamos problemas dos mais complexos. Essas mulheres, jovens, adolescentes e crianças que aqui estão e que aqui chegam, encontram, alem do acolhimento, a certeza de que serão ouvidas, e de que serão, sobretudo, considerados seus direitos humanos, muitas vezes, pela primeira vez.
Se pensarmos nas várias convenções internacionais, na nossa constituição, na recente Lei Maria da Penha, percebemos vários avanços. Contudo é preciso pensar no exercício eficaz destes direitos, para que o que esta na lei esteja na vida diária das mulheres.
O machismo não pode ser assimilado naturalmente como única forma de construção das relações, há que se defender cada vez mais a alteridade, o compartilhamento, a solidariedade relações que somem para a construção de uma cultura de paz e para a vivencia integral dos direitos humanos.
Enquanto as leis que garantem os direitos das mulheres não forem parte do cotidiano de cada uma no Brasil e do mundo não podemos falar em respeito à dignidade humana, não podemos falar no exercício e cidadania, não podemos falar em justiça.
Lembrar que já percorremos um longo caminho nos engrandece, mas é preciso olhar para frente é preciso fazer com que a defesa intransigente dos direitos humanos das mulheres se espalhe como uma epidemia, como uma loucura coletiva.
Desde o inicio dos tempos as mulheres que falam são taxadas de loucas, as muitas, que nos antecedem sustentaram muitas vezes altivas este rotulo, entretanto o tempo passam a sociedade muda e podemos ver com outros olhos seu legado, Maria Quitéria, Berta Lutz, Olga Benário, pagu, Chiquinha Gonzaga, Cora Coralina, Consuelo Nasser, honram a luta das mulheres.
Lembrar de Consuelo é lembrar de intrasigência Cintra a luta da justiça, pois seu nome significa luta, significa ousadia, significa combater o bom combate ao lado de quem necessita, significa, sobretudo, compromisso com a luta por uma nova sociedade sem opressores e oprimidos, luta por uma educação não sexista, que contemple a singularidade de cada ser humano desde a infância, sem aprisionar em papeis sociais castradores e violentos.
É por isso que pra nós é uma emocionante tarefa trazer estas palavras no dia de hoje e como já dizia a musica de Beto Guedes: “tudo que move é sagrado” e o legado de Consuelo para toda a sociedade goiana são seis sonhos, o CEVAM , a luta, o movimento, a resistência,esta é portanto uma tarefa sagrada.
Ela escreveu: “Vamos amar e apoiar os derrotados de luz. De gente assim, e somente deles, é o reino dos céus” – nós achamos que o CEVAM é um lugar de luz, que precisa ser preservado.
E assim que convidamos a sociedade aqui presente para voltar os olhos para o Cevam para a possibilidade de resignificação de vidas encerradas em sua existência. Temos obtido muitas vitorias em nossa luta, mas para dar conta de contrapor a violência domestica auxiliando suas vitimas é sempre preciso sonhar mais, buscar mais.
E o Cevam persiste, persistimos, queremos realizar mais sonhos, mudar o cotidiano das mulheres vítimas da violência, e para tanto contamos com todos e cada um de vocês que se fazem presentes nessa noite de alegria e saudação à luta de tantas mulheres, que certamente também deveriam ser homenageadas.
Sabemos que nossa tarefa é árdua, mais também sabemos de nossa ousadia, estamos caminhando e como diz o poeta Tiago Melo:
“não tenho caminho novo,
o que tenho e novo é o jeito e caminhar...
Aprendi, o caminhar cantando,
como convém a mim e aos que vão comigo,
pois já não vou mais sozinho.”
Sabemos que não estamos sozinhas e que muito ainda há a construir, pois são vários os sonhos.
E também dizia o poeta, sonhar já é um começo, e é pelo sonho que temos vivido pelo sonho que seguimos, por ele moldamos a argamassa da violência em alegrias, transformando dor em coragem, raiva em tolerância, fazendo de cada tombo um paço de dança.