Dom Washington lança campanha da Fraternidade na Assembleia
Senhoras e Senhores. Senhor Presidente.
Agradeço a todos os Deputados pela aprovação da propositura desta Sessão apresentada pelo Deputado Humberto Aidar. Por mais um ano, tenho a alegria de aqui comparecer, a fim de apresentar-lhes algumas das grandes e sérias interpelações que a Campanha da Fraternidade traz para a Igreja e para a Sociedade. Aliás, vejo momentos como este, Senhor Presidente, como uma forma concreta do Estado e a Igreja irmanarem-se, no respeito à autonomia de cada qual, na busca comum pelo bem. A Igreja existe, de modo particular, para testemunhar o bem, a caridade, o amor maiúsculo, que é o próprio Deus. É sua missão promover a vida, pois o próprio Cristo foi enviado pelo Pai para anunciar o evangelho da vida. E o Estado existe para assegurar os meios eficazes, jurídicos, estruturais para que todos vivam de modo tangível o bem comum. São com estas inspirações que a Igreja aqui comparece e em razão das quais a Assembleia Legislativa nos acolhe.
Ao chegar em Angola, recepcionado por um mar de peregrinos, estimado, pelas autoridades, em mais de dois milhões de pessoas que inundaram os 20 hectares da Esplanada de Cimangola, nos arredores de Luanda para ver e ouvir o Santo Padre, o Papa iniciou aquela visita apostólica dizendo: “Vim à África precisamente para proclamar a mensagem de perdão, de esperança e de uma nova vida em Cristo”. “A Palavra de Deus é uma Palavra de esperança sem limites. Deus nunca nos considera um caso perdido. Continua a convidar-nos a erguermos os olhos para um futuro de esperança, e promete-nos a força para realizar”.
Estas palavras parecem ser também dirigidas a nós, brasileiros, goianos. E parecem estar intimamente vinculadas à Campanha da Fraternidade deste ano, que tem como tema, como os senhores já sabem, a questão da segurança pública. É uma Campanha que convoca todos a serem irmãos. É uma Campanha que visa a colocar em destaque a prática do amor universal, do bem maior, sobretudo numa época em que a intolerância, muitas vezes, aparenta reinar.
A violência é uma das chagas da qual padece nossa sociedade, nas cidades e no campo. Parece querer reinar em nosso meio um espírito de intolerância. Os últimos acontecimentos noticiados pela imprensa, como sabemos, dão conta dos maus tratos dos quais continuamente as crianças e as mulheres continuam sendo as maiores vítimas. Tudo isso conduz a uma espécie de banalização da vida. Mata-se, suicida-se ou se violenta pessoas com uma naturalidade preocupante.
Há lugares, no Brasil, nos quais foram instalados grandes letreiros eletrônicos que funcionam como contadores dos homicídios apurados ou indicam a quantidade de dias transcorridos desde o cometimento de algum crime bárbaro e que ainda permanecem impunes os seus autores.
Além da intolerância, vemos um clima generalizado de desconfiança por parte da população em relação à segurança pública. Também da parte dos detentos em relação à sociedade e, nela, o Estado.
A Campanha tem como tema “A Fraternidade e a Segurança Pública” e o seu lema é “A paz é fruto da justiça”. O objetivo geral é “suscitar o debate sobre a segurança pública e contribuir para a promoção da cultura da paz nas pessoas, na família, na comunidade e na sociedade, a fim de que todos se empenhem efetivamente na construção da justiça social que seja garantia de segurança para todos”.
Quero aqui recordar, Senhor Presidente, o quanto as Campanhas da Fraternidade já contribuíram para a conquista da segurança pública. Recordo algumas destas Campanhas com seus temas: em 1974 e em 1984 o tema foi Fraternidade e Vida; em 1995 o tema foi a fraternidade e os excluídos; no início do novo milênio, no ano 2000, o tema foi Dignidade Humana e Paz, um novo milênio sem exclusões; em 2005 o tema foi Solidariedade e Paz, discutindo o problema da vida e da justiça social. Outros foram os temas, profundamente ligados à questão da Segurança Pública, tais como: o mundo do trabalho, a questão do desemprego, das migrações, a questão fundiária, o mundo da política, a problemática do menor, do negro, da mulher, dos encarcerados. Estes são apenas alguns exemplos de temas apresentados ao longo destes 46 anos de existência da Campanha da Fraternidade.
Por si, apenas, todas as Campanhas da Fraternidade tem como objetivo contribuir para que o mundo viva de modo mais pleno e eficaz o supremo mandamento do amor. Em muitos lugares no mundo já existem experiências exitosas de banimento da violência dentro dos presídios e na vida das comunidades em razão de atitudes concretas que revelam este amor.
É preciso que todos nós, Igreja, comunidades, instituições, governos, olhemos para as atitudes de Jesus que indicam como devemos fazer para que a paz e a justiça aconteçam: é preciso fazer-se criança, tornar-se o menor dentre todos; é preciso não desprezar nenhum dos pequenos, aqui entendidos não apenas como as crianças, mas, também, todos aqueles que necessitam do amparo social; e, por fim, é preciso perdoar sempre. Um sistema judicial que alimenta o ódio é totalmente contrário aos desígnios de Deus. É preciso superar um determinado conceito de justiça que afirma que cada um deve pagar por aquilo que fez.
O elo da cadeia da violência precisa ser rompido.
O homem foi criado por Deus para construir e viver num mundo onde reina a paz. Cristo é o Príncipe da Paz. Na medida em que as pessoas convertem-se para Cristo e passam a viver conforme o Mandamento do amor por Ele deixado como testamento, aí, sim, podemos acreditar que uma paz verdadeira reinará em Goiânia, em Goiás, nas grandes capitais, nas pequenas cidades do Brasil e no mundo inteiro.
Um dos problemas mais enraizados na mente humana e no tecido social e que gera a violência é a ausência do sentimento de humanidade que muitas pessoas demonstram, sobretudo aquelas que praticam atrocidades. A ausência do amor no coração das pessoas, por inúmeras razões, desde aquelas mais pessoais até as razões conjunturais, conduz a um enfraquecimento da noção mais fundamental para a vida humana: todos somos irmãos.
A violência gera a insegurança e vice-versa. Um novo humanismo precisa logo nascer. Ainda iluminados pela visita do Santo Padre ao continente africano, sobre esse tema apresento o que ele ensinou quando se encontrou com os bispos de Angola e de Santo Tomé: “De fato, contra um relativismo difuso que nada reconhece como definitivo e tende a defender como última medida apenas o próprio eu e os seus caprichos, nós propomos outra medida: o Filho de Deus, que é também verdadeiro homem. Ele é a medida do verdadeiro humanismo”. Cristo é a estatura maior e definitiva do homem. Em Cristo, o homem é capaz de romper com sua própria pequenez e ver-se como criatura amada por Deus e como pessoa dotada de uma intrínseca capacidade de amar, de perdoar, de superar toda forma de ressentimento e de dor.
É Ele, Cristo, quem reconcilia todas as pessoas entre si e com Deus. O tempo quaresmal nos recorda que “a obra da reconciliação realizada por Jesus tem como centro o mistério da cruz. Ensina o texto-base da Campanha: “O que realiza a reconciliação não é a cruz, como mera expressão do sofrimento, da dor e da morte, mas como expressão maior do amor vivido, como expressão da obediência de Jesus” (nº 217).
E o mistério da cruz nos mostra o sentido mais profundo do amor que não quer nada para si próprio, mas tudo para os outros. Portanto, tanto as pessoas envolvidas em atos violentos, quanto a sociedade de modo geral são conclamados a renunciar toda prática que atente à vida humana. Todos devem se esforçar por libertarem-se do ciclo iníquo gerador de violência. E a deporem as armas, a deporem os instrumentos de morte, a deporem tudo o que gera sofrimento. Espíritos desarmados, pessoas desarmadas, grupos desarmados serão capazes de iniciarem um belo e profícuo diálogo. Será o começo da realização da civilização do amor. Desta utopia, deste projeto, a Igreja não pode abrir mão, nem deixar de anunciá-lo. Para esta esperança também fomos chamados pelo Senhor, para que testemunhemos no mundo o evangelho da paz.
Vejamos ainda um pouco mais como as palavras do Santo Padre nos iluminam nesta Campanha da Fraternidade. Ao despedir-se do povo angolano e de todos os católicos africanos, na segunda-feira da semana passada, o Papa Bento XVI conclamou a todos para “progredir a paz, cumprindo gestos de perdão e trabalhando pela reconciliação nacional, para que jamais prevaleça a violência sobre o diálogo, o medo e o desânimo sobre a confiança, o rancor sobre o amor fraterno”.
Faço minhas estas palavras do Papa em Angola: “Olhai o futuro com esperança, confiai nas promessas de Deus e vivei na sua verdade. Deste modo, construireis algo destinado a permanecer e deixareis às gerações futuras uma herança duradoura de reconciliação, justiça e paz”. A obra da reconciliação social em vista da paz, da equidade, da justiça deve ser um esforço de todos nós, Igreja e Sociedade com seus poderes e organismos públicos constituídos. Uma sociedade pacífica é uma sociedade onde a segurança pública é eficaz, calcada no princípio fundamental do respeito à dignidade humana e suficientemente firme para assegurar o controle das tensões sociais sem arrogância e sem vilipendiar os direitos humanos.
Finalizando, agradeço, mais uma vez, Senhor Presidente, Deputado Helder Valin, Senhor Deputado Humberto Aidar e a todos os Deputados desta Casa Legislativa pela oportunidade de compartilhar destas preocupações. Com certeza, elas também estão na agenda do dia do trabalho legislativo dos Senhores e das Senhoras.
Unamo-nos na busca de soluções que visem o bem de todos. Afinal, Cristo veio para que todos tenham vida. E para que a vida seja plena (Jo 10,10).
Deixo um cumprimento também às Comissões de trabalho dessa Casa Legislativa, aos funcionários administrativos que aqui atuam, aos assessores e chefias. Sobre todos rogo a bênção de Deus e a proteção da Bem Aventurada Virgem Maria, Mãe de Jesus.
Obrigado a todos.