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Nossa realidade na telona

19 de Junho de 2024 às 08:00
Nossa realidade na telona
Parlamento goiano comemora os 126 anos do cinema nacional com mostra de filmes regionais, em evento aberto ao público gratuitamente. Curtas-metragens e um longa serão exibidos na Casa nos dias 19 e 20 de junho.

O cinema brasileiro completa, em 19 de junho, 126 anos de existência com muitos momentos marcantes, em diferentes épocas. Uma trajetória que o torna uma das mais importantes expressões, não apenas da cultura brasileira, em toda sua riqueza e diversidade, mas também das questões históricas e sociais do País.  

O Brasil sempre foi muito bem representado no exterior pelo cinema nacional, como quando ganhou a Palma de Ouro no festival de Cannes (França),  com "O Pagador de Promessas" (1962), ou o Urso de Ouro (melhor filme) e o Urso de Prata (melhor atriz, Fernanda Montenegro) com "Central de Brasil" (1998), no Festival Internacional de Cinema de Berlim (Alemanha). Mais recentemente, foi a vez do ator Wagner Moura, que já tinha obtido boa projeção internacional com "Tropa de Elite" e a série "Narcos", projetar mais uma vez o Brasil como astro da produção norte-americana "Guerra Civil", sucesso de bilheteria em todo o mundo.

Mostra regional

E é para comemorar esses 126 anos de existência que, nos dias 19 e 20 de junho, a Assembleia Legislativa de Goiás, por meio da Diretoria de Cultura, Esporte e Lazer, promove o evento "Em Tela", com exibição de filmes e bate-papos sobre diferentes etapas da produção cinematográfica. A mostra, a ser realizada no auditório 2 da Alego, conta com o apoio das secretarias estaduais de Educação (Seduc) e de Cultura (Secult).

Durante a programação, os diretores de cinema Leandro Portoh, Elisa Marques e Isabela Eva falarão sobre o trabalho no set de filmagens e mostrarão ao público alguns de seus trabalhos. A lista inclui curtas-metragens e um longa. O acervo audiovisual do Museu da Imagem e do Som de Goiás (MIS) e o Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (Fica), que termina no final de semana anterior ao evento na Alego, também serão temas durante os dois dias de atividades.

O "Em Tela" visa valorizar a produção regional, além de incentivar e difundir informações relacionadas ao audiovisual, bem como proporcionar o acesso dos estudantes à cultura. Por meio da parceria com a Seduc, cerca de 200 alunos de três instituições da rede pública participarão das atividades.

Para promover o evento, a Diretoria de Cultura parte do pressuposto que, enquanto forma de expressão artística e cultural, o cinema tem importância fundamental na discussão e no estímulo à reflexão sobre temas importantes, nos âmbitos político e social, de modo que eventos como esse contribuem para a educação cidadã e para o fomento da cultura em Goiás.

O evento será aberto ao público, sem emissão de ingressos. A entrada é limitada ao número de vagas do auditório 2 da Alego, onde será realizada a programação, e aqueles que desejarem poderão contribuir doando um quilo de alimento não perecível. As doações serão encaminhadas a uma instituição beneficente pelos palestrantes Leandro Portoh e Elisa Marques.

Início

Há controvérsias, mas a história do cinema brasileiro começa oficialmente em 19 de junho de 1898, quando foram gravadas as primeiras imagens com o cinematógrafo no Brasil, pelo italiano Afonso Segreto. Ele registrou  a Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, a bordo de um navio.

Ao longo destes mais de 100 anos, a produção nacional teve muitos momentos de glória. Exemplos recentes são os já citados "Central do Brasil" (1998) e "Tropa de Elite" (2007), além de "Cidade de Deus" (2002), que foram aclamados em vários países e conquistaram prêmios internacionais.

"Central do Brasil", dirigido por Walter Salles, ganhou entre outros prêmios, o nosso primeiro Urso de Ouro em Berlim e o Urso de Prata de melhor atriz para Fernanda Montenegro. Com roteiro de João Emanuel Carneiro e Marcos Bernstein, o filme conta a história da ex-professora Dora (Fernanda Montenegro), que conhece o garoto Josué na estação de trens Central do Brasil, no Rio de Janeiro, e o acompanha em viagem pelo interior do Nordeste em busca do pai do menino, que ele não conhece.

"Cidade de Deus", de Fernando Meirelles, relata como o tráfico de drogas se estruturou nas favelas do Rio de Janeiro nos anos 1980 é um dos momentos mais importantes do cinema brasileiro. Foi indicado para quatro Oscars em 2004: melhor diretor, melhor roteiro adaptado (Bráulio Mantovani), melhor edição (Daniel Rezende) e melhor fotografia (César Charlone). Até então, nenhum filme brasileiro tinha sido escolhido para essas categorias nem recebido mais de duas indicações ao prêmio da Academia de Hollywood.

Algo parecido aconteceu com "Pixote, a Lei do Mais Fraco" (1980), de Hector Babenco. O filme fala de uma realidade parecida com a da comunidade Cidade de Deus, mas com história ambientada em São Paulo. Conta a história de um garoto que foge de um reformatório para menores infratores e passa a se envolver em atividades criminosas com assaltantes e traficantes nas ruas da capital paulistana.

Fernando Ramos, o intérprete de "Pixote", foi recrutado de uma favela paulista, para onde voltou depois do filme. É um retrato tão realista da situação daquela época, que o ator foi morto alguns anos depois, aos 19 anos, por policiais militares, sob a acusação de estar envolvido com atividades criminosas e ter reagido a uma abordagem.

"Tropa de Elite" denunciou, de forma nua e crua a violência, a corrupção e a vida dura dos policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) carioca. Ao mesmo tempo levou multidões aos cinemas. O sucesso foi tão grande que em 2010 veio uma continuação, com "Tropa de Elite 2", que repetiu o feito.

"Dona Flor"

A lista de sucessos de bilheteria é grande, com filmes para todos os gostos, como "O Auto da Compadecida", "Se Eu Fosse Você" e "Minha Mãe é Uma Peça". Se for voltando a fita, chega-se a "Os Trapalhões", "Xuxa" e ao que, até pouco tempo, era a insuperável maior bilheteria do cinema nacional: "Dona Flor e Seus Dois Maridos" (1976). A adaptação da apimentada história de Jorge Amado, com Sônia Braga, levou 10,7 milhões de espectadores às salas.

Este número foi superado por outros títulos da atualidade. Mas é preciso levar em conta que a população brasileira na década de 1970, quando "Dona Flor" foi lançado, era a metade da atual.

O resgate da história do cinema nacional pode ser ampliado com muitos filmes de outras épocas, como as comédias de Mazaroppi ou o filão erótico representado por títulos, como "A Dama do Lotação", também estrelado por Sônia Braga.

Mas o cinema brasileiro é bem mais do que sucessos de bilheteria. Outros cineastas tiveram um importante papel no reconhecimento da crítica internacional, como os integrantes do movimento do cinema novo. Glauber Rocha conquistou o respeito dos europeus com filmes, como "Deus e o Diabo na Terra do Sol" e "Terra em Transe". Outros nomes também consagraram o movimento pelo mundo, como Nelson Pereira dos Santos, Arnaldo Jabor, Cacá Diegues e Joaquim Pedro de Andrade.

"O Pagador de Promessas" (1962), adaptado da peça de Dias Gomes, com direção de Anselmo Duarte, é o único filme brasileiro a ter recebido até hoje a Palma de Ouro em Cannes.

Mas já tínhamos um grande ícone da sétima arte nacional, lançado em 1931, no Rio de Janeiro. Trata-se de “Limite”, de Mário Peixoto, considerado um dos filmes mais importantes do cinema brasileiro. Conta a história de três náufragos, duas mulheres e um homem, que vagam perdidos numa canoa em alto mar. Uma dessas mulheres conta como escapou da prisão com a ajuda de um guarda.

Carmem Miranda

Nos anos 1930,  sobressaíram ainda a obra de Humberto Mauro e a produtora Cinédia, no Rio de Janeiro, onde surgiu Carmem Miranda, a pequena notável que brilhou também nas produções hollywoodianas.

Também no Rio de Janeiro, foi criada, em 1941, a produtora Atlântida Cinematográfica, que lançou Grande Otelo. O ator surgiu para a fama ao interpretar a si mesmo no filme “Moleque Tião” (1943), baseado em sua própria vida.

Como se vê, são muitas histórias. E aqui não foram contadas nem a metade delas. O importante é que, depois de enfrentar muitas turbulências ao longo desses mais de 100 anos, o cinema brasileiro está mais vivo do que nunca.

Importante lembrar que a produção nacional foi exterminada na década de 1990 no Governo Collor de Mello, que, numa canetada extinguiu a Embrafilme e o País ficou longos anos sem produzir um longa. Mas depois renasceu das cinzas como o movimento da retomada, cujo auge foram os já mencionados "Tropa de Elite" e "Cidade de Deus".

Em Goiás

Goiás também participou desse movimento de efervescência do cinema nacional. Surgiu o Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (Fica) e inúmeros outros festivais. As leis de incentiva têm fomentado uma vasta produção local que, a cada ano, está consolidando a produção goiana. Bem antes, nas décadas de 1960 e 1970, tivemos João Bennio, ator e diretor que se instalou em Goiânia e projetou o nome do Estado no Brasil.

Agora o cinema nacional chega ao público não apenas na sala escura, mas também na televisão, na internet e nos streamings. E o que é melhor, atualmente é produzido nos mais diferentes sotaques, em todas as regiões do País.

Ranulfo Borges
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