Em audiência pública, especialistas alertam para vulnerabilidade de crianças e adolescentes na internet
Na manhã desta terça-feira, 29, a Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (Alego) realiza uma audiência pública para debater o tema "Adolescência e violência nas redes sociais", por iniciativa do deputado Virmondes Cruvinel (UB). O encontro, realizado no Auditório Carlos Vieira, tem contado com falas impactantes de autoridades e especialistas na área de proteção à infância e juventude.
O delegado de Polícia Civil e coordenador do Laboratório de Operações Cibernéticas da Secretaria Nacional de Segurança Pública, Alessandro Barreto, alertou para a gravidade das ocorrências envolvendo jovens na internet. "Atrocidades, barbaridades que antes eram impensáveis hoje são cometidas e transmitidas por crianças e adolescentes. Precisamos abrir os olhos porque hoje nossos filhos podem estar em risco dentro de casa", afirmou. Segundo ele, “há crianças sendo escravizadas digitalmente, obrigadas a atos degradantes, enquanto seus pais, muitas vezes, desconhecem o que ocorre nas redes sociais".
A juíza de direito Célia Regina Lara, que chefia a Coordenadoria da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO), destacou o pedido de socorro dos adolescentes. "O adolescente de hoje pede ajuda. Eles vivem expostos em um mundo digital sem freios e precisam ser protegidos com responsabilidade", pontuou. A magistrada também lembrou que "o abismo geracional e a incapacidade dos adultos em acompanhar as mudanças digitais agravam ainda mais o cenário de vulnerabilidade".
O presidente da Frente Parlamentar Mista da Primeira Infância, deputado federal Zacharias Calil (UB), reforçou a importância dos cuidados desde a primeira infância. "Tudo acontece dos 0 aos 6 anos. Se investirmos nesta fase, formaremos adultos mais saudáveis e com menor índice de criminalidade. O que estamos vendo hoje é reflexo da falta de atenção e estímulo adequados desde cedo", disse. Ele também ressaltou que atualmente "crianças estão sozinhas em seus quartos, conectadas a perigos que não vemos, mas que destroem vidas".
O representante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Rafael Sousa Cardoso, abordou a necessidade de olhar para o adolescente e não apenas para o ato infracional. "O que leva um jovem a cometer atos tão graves é a busca de reconhecimento e pertencimento no mundo digital. Eles não encontram no mundo real o que precisam e acabam vítimas e algozes na internet", observou. Ele defendeu a implementação de um protocolo nacional de avaliação de risco e necessidade para adolescentes no Brasil.
A superintendente da Polícia Federal de Goiás, delegada federal Marcela Rodrigues de Siqueira Vicente, trouxe relatos de casos chocantes envolvendo abusos cometidos dentro do ambiente familiar. "O que antes temíamos nas ruas, hoje acontece dentro de casa. Irmãos abusando de irmãos, incentivados por estímulos digitais distorcidos", destacou.
O delegado da Polícia Federal Flávio Rolim Pinheiro Resende, representante da Diretoria de Combate a Crimes Cibernéticos, apontou a influência de subculturas online no comportamento violento de jovens. "Essas subculturas radicalizam adolescentes em várias camadas, expondo-os a ideologias de ódio e violência, muitas vezes importadas de outros países", explicou.
Michelle Martins, representante do Conselho Nacional do Ministério Público, enfatizou a importância da educação desde a primeira infância para formar cidadãos capazes de lidar com os riscos do mundo digital. "A internet não é vilã. Precisamos ensinar as crianças a usá-la de forma segura. A responsabilidade é de toda a rede de proteção, não apenas das famílias", afirmou.
A subprocuradora-geral para Assuntos Institucionais da Associação Nacional dos Defensores Públicos, Sandra Mara Garbelini, trouxe dados alarmantes sobre o impacto da internet na saúde mental dos jovens. "Desde a popularização das redes sociais, a depressão e a automutilação entre jovens aumentaram 150%. Isso mostra o quanto é urgente a prevenção e o trabalho articulado de toda a sociedade", alertou.
A defensora pública Débora Vidal, titular da Primeira Defensoria Pública Especializada da Infância e Juventude, compartilhou experiências concretas de sua atuação, destacando a importância do controle de acesso das crianças à internet. "O que as crianças veem nas telas molda sua percepção da realidade. Um vídeo assistido sem supervisão pode gerar falsas memórias, destruir famílias e causar danos irreparáveis", relatou.
A delegada estadual Marcella Cordeiro Orçai explicou que, durante o cumprimento de mandados de busca e apreensão relacionados a crimes de abuso e exploração sexual online, é possível observar o ambiente familiar das vítimas. Para ilustrar, relatou dois casos recentes: no primeiro, uma vítima no Rio de Janeiro teve sua intimidade violada, com imagens divulgadas em plataformas cujo gerenciamento e disseminação ocorreram em território goiano. "Nós não estamos distantes dessas situações. O canal era aqui em Goiás", alertou.
O segundo caso abordado envolveu um adolescente que sofria ataques virtuais, inicialmente atribuídos a outras regiões. Contudo, as investigações revelaram a participação de pessoas no próprio estado. "É algo que nos tocou profundamente, pois a estrutura familiar era sólida, mas, ainda assim, o diálogo não foi suficiente para evitar a aproximação dos criminosos", lamentou.
A delegada reforçou que os pais devem estar atentos, não apenas monitorando os celulares dos filhos, mas também reconhecendo sinais sutis de que algo pode estar errado. "Às vezes achamos que é distante da nossa realidade, mas está mais perto do que imaginamos. A internet encurta essa distância", afirmou, defendendo ações de conscientização e vigilância constante no ambiente familiar.
A audiência pública traz o debate e busca soluções para enfrentar os desafios contemporâneos da proteção de crianças e adolescentes no ambiente virtual. O evento segue com encaminhamentos que visam a fortalecer políticas públicas preventivas e ações integradas para o enfrentamento da violência nas redes sociais.