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Alguém ainda acha que os Direitos Humanos só servem pra proteger bandido?

08 de Julho de 2008 às 09:57
A postura da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa diante de questões ainda tidas como divergentes é abordada pelo deputado Mauro Rubem, neste artigo, que foi publicado no jornal Diário da Manhã. (07.07.08)

* Mauro Rubem é deputado estadual e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa.

Nesses últimos anos, avançamos muito em nossa capacidade de organização. A Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa é respeitada por seu ativismo. Hoje, mostra quão importante é o tema dos direitos humanos para a construção da democracia.

Nosso papel é empurrar os governos e instituições para frente e, por isso, somos críticos e impertinentes. Se não o fôssemos, estaríamos deixando de cumprir o nosso papel político e civilizatório.

A questão da segurança pública em Goiás é um elemento-chave da construção da cidadania e interfere diretamente na consolidação da democracia regional.

Nesse contexto, reaparecem as respostas fáceis, que conquistam rapidamente as mentes entorpecidas pelas ideologias políticas dominantes, que pregam mais e mais violência como forma de eliminação física dos pobres, homossexuais e excluídos e vêem na implantação do terror do Estado, por meio da polícia violenta, das prisões infectas e dos esquadrões da morte a maneira de preservar a propriedade de uns poucos. Pedem a pena de morte, mas esquecem que ela já existe, na prática. Milhares de jovens, notadamente os negros, empobrecidos, são mortos todos os anos por ações violentas da polícia, mortes seletivas, dirigidas à eliminação de um segmento da população.

Os policiais não ficam livres da brutalidade: também são vítimas do mesmo modelo violento e da lógica do extermínio e do genocídio. Quanto mais violenta e letal é a política de segurança, mais brutal é a reação dos criminosos. Círculo vicioso que não se rompe com mais violência. É necessário mudar a lógica reinante. O encarceramento não é solução, mas o Judiciário goiano parece que só crê nesse método, incham penitenciárias e as transformam em locais de tortura permanente, infectas e desumanas, criam o ambiente ideal para a proliferação do crime, do ódio e do rancor que se organizam em facções e “partidos” e ameaçam a sociedade.

Sabemos que as causas da violência são várias: têm laços com a escravidão, que dominou a política e a economia brasileiras por séculos; são produto e fermento dos modelos políticos excludentes, clientelistas, patrimonialistas e antidemocráticos que dominam a história do Brasil; têm relação direta com a opção por não dar à educação a prioridade necessária; e estão relacionadas, de modo especial, aos modelos de desenvolvimento econômico implementados no Brasil nas últimas décadas. Crescimento econômico baseado na exclusão, na migração em massa de mão-de-obra desqualificada, na preservação de um mercado de trabalho desumano, na manutenção de um desemprego alto que pressiona os salários para baixo e mantêm as reivindicações dos trabalhadores sob controle.

Crescimento econômico que mantém o Brasil como o país mais desigual do mundo. Modelo econômico que privilegia o agro negócio, que expulsa gente do campo e engorda somente as multinacionais e ameaça definitivamente a biodiversidade brasileira.

Na educação, em vez de uma reforma educacional que valorize a escola pública, o Estado prefere uma ação que salva os empresários do ensino superior da crise de superoferta de vagas. O dinheiro público salva empresários que usam a oferta de um ensino de péssima qualidade como meio de enriquecimento.

O assistencialismo substitui políticas emancipatórias; a reforma agrária se arrasta devagar e sem rumo; o meio ambiente é relegado a segundo plano - em seu lugar está o interesse da transgenia, das multinacionais do agro negócio; a demarcação de terras indígenas pára, estanca; a violência contra indígenas cresce e agentes públicos começam a falar que eles têm terra demais! A Constituição, que defende os povos indígenas, é rasgada todos os dias. Recursos para a infância decrescem e o Estatuto da Criança e do Adolescente não é implantado.

Quanto aos idosos, somos o sexto País em mortalidade por acidentes e violências que constitui um grande percentual dos óbitos.

Uma das nossas principais demandas é o de discutir os direitos das mulheres em todas as dimensões; seja nas relações de trabalho, no direito que as mesmas têm sobre o seu corpo e a sua sexualidade e, especialmente o enfrentamento a violência.

Cada quatro prefeituras deste Estado, três estão envolvidas em situações graves de desvio de recursos públicos. A corrupção deixa de ser exceção. Seu combate é fundamental, é uma questão ética primordial, mas também é condição para que o governo se transforme em instrumento de proteção e garantia dos direitos humanos.

Não se pode mais permitir que recursos da merenda escolar, da saúde pública, da educação infantil sejam desviados para enriquecer pessoas e empresas, mantendo na miséria - na miséria material e na miséria política - milhares de pobres.

O reconhecimento de que a Saúde é um direito fundamental do ser humano e a responsabilização do Estado pela sua efetivação assegura sua promoção a todos. Lutar pela Saúde é lutar para que todos tenham vida plena. Vincular a Saúde mental aos Direitos Humanos é ampliar a visão do cuidado. O direito das pessoas portadoras de transtorno mental de serem tratadas com humanidade precisa ser uma realidade definitiva.

As autoridades do Executivo - especialmente dos executivos estaduais - e do Judiciário preferem continuar a criminalizar os movimentos sociais e os defensores e as defensoras de direitos humanos.

Em Goiás, o Judiciário foi construído e se mantém sob a lógica da proteção da classe dominante e de seu patrimônio. Ricos, abastados e poderosos são protegidos. Aqui como exemplo, rompendo contra o nosso grito de alerta e repulsa, o despejo forçado, violento de três mil e quinhentas famílias do Parque Oeste Industrial, em Goiânia, causando a morte de duas pessoas, uma ficou paraplégica e diversas outras ficaram feridas. Uma vergonha internacional.

Os defensores e as defensoras de direitos humanos, continuam submetidos a grande vulnerabilidade; onde se reafirma que defensor e defensora de direitos humanos é só "defensor de bandido".

Há solução para isso? Há sim. E nós, defensores e defensoras de direitos humanos, participantes, ativistas e militantes de entidades da sociedade civil e de movimentos sociais que defendemos a justiça, a democracia e o desenvolvimento com igualdade, somos os primeiros e as primeiras a dizer que há outro mundo possível; que há outros caminhos possíveis e necessários; que o mundo precisa de outro Brasil. Que o Brasil precisa de um outro Goiás.

Nossa luta é por direitos humanos. Viemos aqui para lutar. Não nos intimidamos diante da violência, da injustiça, da prepotência, da arrogância do poder, do crime organizado e do terrorismo de Estado. Não nos detemos diante dos fundamentalismos religiosos, políticos ou econômicos.

A Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa vai avançar o tema no Estado. Fomos legitimados a trabalhar em Goiás o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, um projeto de sociedade baseada nos princípios da democracia e da justiça social; de construção de uma cultura de direitos humanos, entendida como processo a ser aprendido e vivenciado numa perspectiva de cidadania ativa.

Parceiros chegam a todo instante, pessoas otimistas, que acreditam na capacidade de renovação e criação. Quem defende e luta pelos direitos humanos pode ter certeza: aqui estão defensores e defensoras que querem produzir um mundo novo, justo, solidário e humano.

Toda grande transformação começa com um ideal. Conheça os direitos humanos mude uma nação.

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