Relatório da Comissão Pastoral da Terra sobre conflitos no campo em 2023 é debatido em evento de Mauro Rubem
O deputado Mauro Rubem (PT) promoveu, na manhã desta terça-feira, 11, audiência pública para o lançamento de relatório, com análise estadual de dados, sobre conflitos no campo em 2023. A publicação integra a série histórica que vem sendo registrada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), desde 1985.
“Nós estamos vivendo aqui em Goiás um momento crítico, com mais de 40 conflitos graves. Estão em jogo não só a violência e a integridade física dos manifestantes, mas, sobretudo, o modelo de cuidar da terra. Defendemos um projeto de sustentabilidade, tendo a agroecologia e a proteção ambiental como princípio. É defender a terra não para lucro, mas para alimentar o povo”, ressaltou Rubem.
Para o parlamentar, o Poder Legislativo desempenha papel fundamental na promoção de leis que assegurem o direito constitucional de acesso à terra aos trabalhadores rurais e às famílias camponesas. Ele aproveitou a oportunidade para defender a escolha consciente de candidatos, nas eleições municipais, que se aproximam desse objetivo.
“Destaco duas atitudes rápidas. Primeiro, veja quem você vai eleger - vereadores e prefeitos - porque, hoje, a própria institucionalidade é um grande violador de direitos e estimulador dessa violência. Ao mesmo tempo, nós queremos que o Parlamento goiano revogue todas as leis que têm estimulado a violência pelo próprio Estado”, ponderou.
Dentre as medidas a serem revogadas, está a Lei nº 22.419/2023, que institui a política estadual de segurança pública nas margens das rodovias goianas. Para os participantes do evento, a legislação, em vigor desde o final do ano passado, cria mecanismos para a repressão e supressão de direitos das famílias em situação de vulnerabilidade acampadas à beira das estradas.
O evento foi realizado no auditório 1 da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) e contou com a participação de representantes do Poder Judiciário, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e de movimentos sociais e sindicais do campo. A programação teve transmissão ao vivo no canal do Youtube e a gravação pode ser assistida, na íntegra, clicando aqui.
Debate
Representando o Ministério Público Federal, o procurador República em Goiás, Wilson Rocha, integrou mesa de debate sobre o tema. Ele informou que o órgão encaminhou uma representação recebida de movimentos sociais ao grupo de trabalho Reforma Agrária da Procuradoria Federal de Direitos do Cidadão, o que contribuiu para a construção de uma nota técnica que aponta inconstitucionalidades na lei aprovada em novembro do ano passado pelo Plenário da Alego.
“Essa norma criminaliza explicitamente uma estratégia de mobilização popular e exclui de programas sociais as pessoas que participam desses movimentos. A reforma agrária não é bandeira ideológica de movimento ou partido político, ela é um direito fundamental, é uma política com assento na Constituição. Há registros muito consistentes de um movimento camponês forte reivindicando uma partilha mais igualitária da terra em Goiás e que, por razões históricas, está concentrada na mão de poucas pessoas, em latifúndios”, pontuou.
Saulo Reis, coordenador da CPT/GO, fez coro à fala do procurador e destacou as expectativas do evento. “Nós esperamos denunciar essas violações de direitos, essa violência cometida contra as mais de 5 mil famílias que vivem em acampamentos no Estado de Goiás e também comprovar a ação inconstitucional do Estado referente aos despejos, muitos deles, inclusive, sem ordem judicial. Isso é muito grave, sobretudo quando a gente vê empresas do agronegócio, que tanto incentivo recebem dos governos e tanto lucro fazem, perpetuando condições de trabalho análogas à escravidão”.
Relatório
Com número de registros saltando de 80, em 2022, para 167, em 2023, o relatório revela um aumento, no último ano, de mais de 108% nas ocorrências de conflitos por terra em Goiás. A situação fez com que o Estado saísse da 9ª posição para ocupar o 5º lugar no ranking que mede a violência no campo no País.
Dentre os tipos de violência destacam-se casos identificados como pistolagem (19 ocorrências), invasões (18), desmatamento ilegal (11), grilagem (7), omissão/conivência (6), ameaças (7), contaminação por agrotóxico (5), violações nas condições de existência (5), destruição de pertences (4), destruição de roçados (4), expulsão (3), incêndio (3) e destruição de casa (2).
Trabalhadores sem-terra (109), quilombolas (10), pequenos proprietários (9), assentados (6) e posseiros (3) configuram as principais vítimas. Na liderança do outro lado do conflito, estão principalmente fazendeiros e o próprio Governo Estadual, que respondem, respectivamente, por 59 e 51 das ocorrências de violências registradas no período. Juntam-se a eles também empresários (7), grileiros (7), o Governo Federal (3), mineradora internacional (3) e grandes arrendatários (2). Governo Municipal, madeireiro, mineradora e político completam o quadro, respondendo por uma ocorrência cada.
Conflitos pela água, em especial, foram notificados nos municípios de Catalão (3), Formosa (2), Ipameri (1), Mimoso de Goiás (1), Minaçu (1), Nova Roma (1) e Santa Helena de Goiás (1).
A situação mais alarmante envolveu denúncias de trabalho escravo, com o registro de 17 operações, das quais foram resgatadas 699 trabalhadores rurais, em 2023. O número representa aumento de mais de 170% em relação ao ano anterior e acaba por fazer de Goiás líder da Federação em ocorrências na área. O segmento do agronegócio é apontado como o principal vilão deste cenário.
A íntegra do documento e demais volumes da série podem ser acessados na página oficial da CPT Goiás.