Imposto solidário
Como parte da ambição de “mudar a cultura da doação no Brasil”, a campanha Dezembro Roxo almeja colaborar com entidades que ajudam crianças e adolescentes arrecadando, potencialmente, em 2024, até R$ 8,52 bilhões de doação de contribuintes.
Até 6% do imposto do Imposto de Renda de cada contribuinte pode ser abatido quando se doa, fazendo com que o gesto não tenha custo para quem decide ajudar e, ao mesmo tempo, gere recursos para os Fundos da Infância e da Adolescência (FIAs).
“É uma forma de fazer o imposto ter um impacto direto e visível, ao invés de se perder no orçamento geral da União. Isso não aumenta o que você paga, apenas permite que você escolha onde o dinheiro será mais bem utilizado”, afirma o integrante das comissões de Direito Previdenciário, Tributário e Civil da OAB/GO, Juliano Ficht.
Trata-se, enfatiza, de “uma maneira de o contribuinte participar mais ativamente da sociedade, vendo o impacto real do recurso”. O valor doado e abatido do imposto, contextualiza Ficht, “normalmente seria usado em áreas como saúde, educação, infraestrutura e segurança, mas, de forma genérica, sem direcionamento específico”.
Cada estado brasileiro tem seu Fundo da Infância e Adolescência, que recebe aportes financeiros para ajudar projetos sociais voltados a menores carentes. Criados em 1994, esses fundos são controlados pelo Conselho Estadual dos Direitos da Criança e Adolescente (Cedca) e fiscalizados pelo Ministério Público.
Nesse ano, a campanha Dezembro Roxo envolve mais de 2.600 cidades brasileiras, abrangendo um total de quase 11 milhões de contribuintes.
Atualmente, a doação nacional alcança R$ 86 milhões, ou apenas cerca de 1% da arrecadação potencial. O Estado de Goiás fica, ainda, abaixo desse percentual, com somente 0,02% de arrecadação potencial, ou R$ 35,7 mil dos R$ 208,9 milhões que podem ser alcançados.
A possibilidade de se fazer doações é amparada pelo art. 260, da Lei no 8.069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente. O site da campanha ressalta que as contribuições “são realizadas diretamente pelos contribuintes, não tendo a Campanha Dezembro Roxo qualquer interferência na escolha das entidades, projetos aprovados nem na gestão dos fundos”.
Finalizada a transferência do valor doado, o contribuinte precisa comprovar para a Receita Federal o depósito que fez ao fundo. Para isso, precisa solicitar ao Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente o recibo da destinação, que deve conter o nome e o CPF do contribuinte, a data e a quantia da doação, bem como o nome do fundo e o CNPJ.
O site da campanha explica, ainda, que, mesmo quem tem imposto a restituir e não a pagar, pode fazer a doação. Nesse caso, a doação será abatida do imposto que já foi pago, ou seja, que ficou retido na fonte, e será somada à restituição.
É claro que é possível doar dinheiro diretamente para alguma entidade assistencial, mas, nesse caso, a doação não pode ser abatida do Imposto de Renda.
Doações via imposto abrangem também outras áreas
Questionado sobre a cultura de doação ambicionada pelo site da campanha, Juliano Ficht explica que há países, como Alemanha e Estados Unidos, em que essa cultura é muito mais forte. “Nos EUA, por exemplo, você pode deduzir doações para instituições de caridade diretamente do imposto, com incentivos que fortalecem o terceiro setor. Na Alemanha, doações para ONGs e projetos sociais também têm limites mais amplos de dedução”.
Aqui no Brasil, avalia o tributarista, “estamos engatinhando nesse tema. Campanhas como a Dezembro Roxo ajudam a mudar essa mentalidade, mas ainda há muito o que fazer, como ampliar os limites de dedução e garantir mais transparência no uso dos recursos. É um caminho promissor para fortalecer a cultura de doação no País”.
Sobre outras iniciativas de imposto solidário, Ficht menciona o Fundo do Idoso, que apoia projetos para a terceira idade, e incentivos para cultura e esportes, como a Lei Rouanet e a Lei de Incentivo ao Esporte. “Todas essas iniciativas”, especifica, tem a “grande vantagem de dar um destino mais transparente e direto para parte do imposto. Por outro lado, o problema é que muita gente não sabe que pode fazer isso. Apesar disso, considero essas iniciativas uma forma incrível de fortalecer causas importantes e dar mais poder de escolha ao contribuinte”.
A Lei Estadual no 20.247, de 30 de julho de 2018, instituidora da campanha de conscientização “Imposto de Renda do Bem”, elenca como objetivos “conscientizar as pessoas físicas e/ou jurídicas sobre o direito de aumentar a restituição ou de promover a dedução do Imposto de Renda” de sete distintas possibilidades de doações. Além dos casos mencionados por Fitch, há outras, como doações ao Programa Nacional de Apoio à Atenção da Saúde da Pessoa com Deficiência (Pronas-PCD); ao Programa Nacional de Apoio à Atenção Oncológica (Pronon); e às entidades privadas sem fins lucrativos, desde que enquadradas no programa de incentivos.
De dois projetos apensados e aprovados no Poder Legislativo – um de Jamil Calife (no 9197/24) e outro de Vivian Naves (no 6222/24), ambos do PP – resultou a inclusão, justamente na Lei no 20.247/2018, do objetivo de divulgar os projetos financiados com recursos destinados aos fundos, programas, entidades e atividades listados na legislação.
Há ainda outras possibilidades de isenção de imposto que geram benefícios sociais. É o caso do projeto de lei ordinária de Charles Bento (MDB), que concede isenção do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) aos veículos automotores movidos exclusivamente à propulsão elétrica produzidos ou emplacados em Goiás (no 6642/24).
“A medida”, explica o deputado na justificativa da matéria, “está em conformidade com a Lei no. 13.755, de 10 de dezembro de 2018, que adotou o consenso do Programa ‘Rota 2030’, no Brasil, e busca aqui incentivar a disseminação de veículos movidos à propulsão elétrica, beneficiando todo o Estado [de Goiás] com a diminuição da poluição e a consequente melhoria do meio ambiente e da qualidade de vida da população”.
Charles Bento prossegue: “Isso, inclusive, reduzirá os gastos do poder público com a saúde decorrentes dos problemas provocados pelos carros à combustão, além de trazer investimentos e gerar empregos no Estado com a tendência dessa nova tecnologia”.
Veja aqui a lista de projetos de lei relacionados a impostos, em trâmite na Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (Alego).