26ª edição do Fica 2025 conecta as principais discussões em tela com projetos de lei sob análise do Parlamento goiano

Em sequência à série de reportagens em comemoração ao mês do meio ambiente, iniciada no último dia 5, a Agência de Notícias da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) traz uma matéria especial sobre turismo e sustentabilidade. O texto tem como gancho uma breve cobertura da 26ª edição do Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (Fica). Como desdobramento do evento, apresentamos, na sequência, uma matéria especial com um pequeno roteiro temático indicando alguns dos principais atrativos que a antiga capital do estado oferece para os seus visitantes.
A abertura do Fica 2025, evento que está em andamento na Cidade de Goiás, foi na terça-feira, 10, e a programação se estende por todo o final de semana, sendo encerrada neste domingo, 15. A presente cobertura conta, ao final, com um breve panorama das discussões em alta no âmbito do Parlamento goiano sobre temas em destaque nesta edição do festival.
O Fica
O festival tem uma programação extensa, que inclui atrações artísticas, fóruns, atividades formativas, ações sociais e exposições diversas. Há também o espaço da Tenda Multiétnica, cuja programação especial inclui rodas de conversa, mesas de debate, exibições cinematográficas, apresentações artísticas e culturais, feira de produtos tradicionais, exposições e mostras protagonizadas por povos indígenas, quilombolas, camponeses e representantes de comunidades tradicionais em geral.
O coração do evento pulsa, no entanto, em torno das quatro mostras competitivas. A mais representativa delas, a Mostra Washington Novaes, contou com mais de 700 filmes inscritos, de um total de 1.200 obras enviadas para todas as categorias. A exibição leva o nome do jornalista paulista, radicado em Goiás, que foi destaque na defesa do meio ambiente, do Cerrado e das populações indígenas. Novaes foi agraciado com o Titulo de Cidadania Goiana em 1988, no então governo de Henrique Santillo.
As informações sobre o evento foram repassadas pelo diretor de programação do Fica, o cineasta Pedro Novaes, que é filho do homenageado citado. É ele quem nos guia nesse breve giro pela programação da edição deste ano.
Por dentro da disputa
Além da Mostra Internacional Washington Novaes, a parte competitiva do festival inclui, ainda: a Mostra do Cinema Goiano, a Mostra Becos da Minha Terra e a Mostra de Cinema Indígena e Povos Tradicionais.
A Mostra Internacional Washington Novaes reúne filmes que tratam da temática ambiental e se destaca como a mais importante do evento. Ao todo, foram exibidas 14 obras, sendo oito de curta ou média metragem e seis longas. Três países estrangeiros (República Tcheca, Alemanha e Cazaquistão) marcaram presença na tela do festival, neste ano.
A Mostra do Cinema Goiano, que reúne filmes feitos no estado de Goiás sobre temáticas diversas, contou com a exibição de nove obras. Já a Mostra Becos da Minha Terra, que apresenta curtas-metragens feitos na Cidade de Goiás, especificamente, contou com a exibição de 10 filmes. “A Cidade de Goiás tem, hoje, uma produção bastante significativa em função de ter lá uma graduação em cinema e um curso técnico de cinema audiovisual no Instituto Federal”, destacou Pedro Novaes.
Por fim, na Mostra de Cinema Indígena e Povos Tradicionais, foram exibidas nove produções, todas realizadas por representantes dessas comunidades.
A programação inclui, ainda, mostras não competitivas e sessões especiais, como o Fica Animado, que, em 2025, conta com nove animações de curta duração. As sessões são especialmente voltadas para as crianças, atendendo também estudantes da rede pública de ensino.
A Mostra Fiocruz reúne 25 produções sobre saúde pública e qualidade ambiental pertencentes ao acervo da Fundação Oswaldo Cruz. A instituição se destaca como uma importante parceira do festival e vem contribuindo também para a difusão do cinema ambiental na TV aberta, por meio da divulgação de obras que integram o acervo do Fica.
Já a sessão especial intitulada “Filmes para adiar o fim do mundo” trouxe dois filmes convidados. O primeiro, Sobre Ruínas, foi exibido na abertura do festival. Trata-se de um curta-metragem, de 17 minutos, da diretora paulista Carol Benjamin. Segundo Novaes, a obra dialoga com o tema do festival, neste ano, que é "Cerrado: a savana brasileira e o equilíbrio do clima”.
A produção, detalha Pedro Novaes, “chama a atenção para o Cerrado, mas numa perspectiva de diálogo com ecossistema similares de outros continentes do sul global, como as savanas africanas e as savanas da Oceania. Esse filme retrata os desafios enfrentados por uma comunidade após sobreviver a uma tragédia climática, mostrando o impacto do evento na memória das pessoas que o vivenciaram”.
Já o outro filme convidado é o “Minha Terra Estrangeira”, que representa a mais recente produção do renomado documentarista brasileiro João Moreira Salles. O cineasta marcou presença no evento, tendo participado de debate sobre a obra. “Esse filme foi dirigido junto com um coletivo indígena chamado Lakapoy e com uma diretora carioca, chamada Louise Botkay. O enredo acompanha a trajetória política e as ações de duas lideranças indígenas, nas eleições de 2022: o Almir Suruí [que foi candidato a deputado federal por Rondônia] e a sua filha Txai Suruí [que é ativista ambiental]”.
Há, ainda, a Sessão Araguaia Vivo; a Sessão Unesco; a Mostra Audiovisual e a Documentação de Línguas e Culturas; a Sessão do Encontro de Escolas de Cinema do Brasil Central e outras duas exibições sobre países estrangeiros, sendo uma sobre a Sérvia e outra sobre o Chipre.
Alguns dos assuntos abordados nessas mostras serão temas de matérias futuras deste especial sobre o meio ambiente, como o caso da crise climática; e também da nova série, aqui, lançada, sobre turismo, como o caso do Rio Araguaia.
Diálogos com o Legislativo
Na sessão, faremos uma conexão dos debates do evento com os projetos em pauta na Alego, tendo como foco, no entanto, apenas os longas em destaque na Mostra Internacional Washington Novaes, dado ao seu caráter predominantemente ambiental. Interessados em apreciar as obras de modo remoto podem assistir e votar nos filmes selecionados, via catálogo disponibilizado na página oficial do evento.
Ao todo, seis longas foram selecionados para compor a Mostra Internacional Washington Novaes, neste ano. A seguir, apresentamos uma breve sinopse destacando o tema central de quatro dessas obras em cartaz, que são referentes às produções nacionais (os outros dois títulos são do Cazaquistão e da Alemanha).
O Silêncio das Ostras é uma obra de ficção de 120 minutos, produzida em Minas Gerais, em 2024, e dirigida por Marcos Pimentel. O filme retrata o drama de uma menina filha de operários que trabalham na mineração e que sobrevive ao rompimento de uma barragem que dizima a vila onde vive.
O enredo faz alusão aos desastres de Brumadinho e Mariana, ocorridos nos anos de 2019 e 2015, respectivamente. Ambos são considerados os maiores desastres ambientais da mineração do país e causaram a morte de 272 e 19 pessoas, respectivamente. Além das perdas humanitárias, houve a contaminação de vários recursos hídricos com lama e rejeitos da mineração, impactando no abastecimento público de água e chegando a atingir, inclusive, ecossistemas marinhos.
A proteção de recursos hídricos em Goiás é tema de três projetos em tramitação na Comissão de Meio Ambiente da Casa. Um deles visa reconhecer os direitos dos Rios das Almas e Meia Ponte, suas nascentes e ecossistemas associados, e instituir mecanismos de proteção e gestão no Estado de Goiás. A matéria é assinada pelo deputado Lineu Olimpio/MDB.
O outro, de autoria do deputado Virmondes Cruvinel (UB), visa a instituir a Política Estadual de Incentivo à Pesquisa para Preservação do Meio Aquático. Já o último, de José Machado (PSDB), busca assegurar o uso exclusivo para o abastecimento público da barragem do João Leite.
Vale citar, ainda, uma propositura da deputada Bia de Lima (PT) que cria a Política Estadual de recuperação de áreas mineradas no Estado de Goiás.
Terra Encantada - O Diabo Velho é um documentário de 120 min, produzido em Goiás, em 2025, e dirigido por Robney B. Almeida. Com uma linguagem poética, o filme traz reflexões sobre o processo de colonização no território goiano. Ao tocar em feridas como a dizimação dos povos originários, a escravização dos povos negros e a destruição do Cerrado, a obra revela como se deu a formação de um dos Estados incluídos entre os mais conservadores da sociedade brasileira.
No Parlamento goiano, o destaque nas discussões vai para projetos que tratam sobre a conservação da sociobiodiversidade do Cerrado, incluindo as iniciativas em prol das políticas de reflorestamento e recuperação de áreas degradadas. Ao todo, seis proposituras contribuem atualmente para esses debates. O primeiro processo, de Wilde Cambão (PSD), instituiu o Programa de Conservação Florestal do Estado de Goiás. O segundo, do Delegado Eduardo Prado (PL), dispõe sobre a construção de corredores ecológicos nas rodovias estaduais que atravessem unidades de conservação ambiental.
O terceiro, de Antônio Gomide (PT), cria a Semana de Conscientização sobre a Preservação da Fauna. Em outro projeto, o autor propõe a criação da campanha “Plante uma Árvore”, na rede pública de ensino do estado. O petista assina também a matéria que tenta proibir o uso da técnica conhecida como “correntão” em todo o território estadual. A prática, comum no Cerrado, consiste na utilização de tratores que arrastam correntes pesadas para promover a remoção rápida da vegetação tanto nativa quanto não nativa.
Já na última propositura identificada, Bia de Lima, busca o reconhecimento das comunidades quilombolas e dos povos tradicionais como agentes ambientais fundamentais para a preservação do Cerrado.
Mãos à Terra: neste documentário gaúcho, de 80 minutos, também produzido em 2025, o diretor Sergio Guidoux acompanha diferentes produtores na busca pela construção de uma alternativa ao problemático modelo agrícola convencional.
Na Alego, são destaque as leis sancionadas a partir de dois projetos de Antônio Gomide. Uma delas impõe limitação para o uso de agrotóxicos e outra cria a política estadual de incentivo à agroecologia e à produção orgânica no estado. Já em tramitação está a propositura de Bia de Lima que visa a instituir a política estadual de incentivo ao plantio direto como forma de promover a agricultura sustentável.
Tijolo por Tijolo é um documentário pernambucano, de 103 minutos, produzido em 2024 e assinado por Victoria Alvares e Quentin Delaroche. Na obra, o espectador acompanha a trajetória de uma moradora da periferia do Recife que perdeu o emprego e a casa por risco de desabamento, em decorrência das fortes chuvas e enchentes na região.
Na Alego, medidas de combate à crise climática, assinados por Rosângela Rezende (Agir), Bia de Lima e Dr. George Morais (PDT), ganham relevo. O primeiro institui o Programa Virada Ambiental como Política Pública para Compensação de Gases de Efeito Estufa (GEEs) das Atividades Econômicas no Estado de Goiás. “A Virada Ambiental promove a compensação voluntária da emissão de gases de efeito estufa por meio do plantio de árvores nativas do cerrado. Nos últimos quatro anos, por meio deste programa, já foram plantadas mais de 1,2 milhão de mudas nativas dentro do Estado de Goiás. O projeto também expandiu sua atuação para 17 outros estados e quatro países, conquistas essas que só foram possíveis graças à participação de diversas instituições no projeto”, justificou Rosângela Rezende.
O segundo processo versa sobre a instituição da Política Estadual de Atenção às Emergências Climáticas. Na justificativa, Bia de Lima relembra os desabamentos ocorridos em 2022, na cidade de Petrópolis, no Rio de Janeiro, e em 2023, no litoral norte de São Paulo. “Nestas ocasiões há sempre um especialista sendo entrevistado pelos repórteres, lembrando a correlação entre as enchentes e a questão climática”, alertou.
Já no terceiro projeto, Dr. George defende a instituição do selo Escola Amiga do Clima, em reconhecimento a iniciativas pedagógicas que promovam a preservação ambiental e conscientização sobre as causas e efeitos das mudanças climáticas, bem como que busquem minimizar a produção de lixo e resíduos, o desperdício de recursos e a emissão de gases de Efeito Estufa.
Também vale lembrar o projeto de Virmondes Cruvinel (UB) para incentivar a implementação de telhados verdes. Segundo o autor, a iniciativa pode contribuir para gerar conforto térmico e reduzir os efeitos provocados pelas ilhas de calor urbano, além de diminuir em até 30% o consumo de energia elétrica com sistemas de refrigeração. “Além disso, os telhados verdes podem proporcionar outros benefícios ambientais, como a redução da poluição do ar, a diminuição do escoamento superficial de águas pluviais e a criação de habitats para a biodiversidade local”.
Panorama do festival
Ao concluir a entrevista, Pedro Novaes traçou um breve panorama histórico do Fica. “Temos mais de um quarto de século de festival. Ano passado, inclusive, a gente tentou fazer um pouco esse balanço, chamando a atenção para o quanto o mundo mudou ao longo desse tempo. Na primeira edição do evento, a maioria dos filmes ainda era filmado e projetado em película e, por essa razão, a quantidade de filmes realizados era muito menor”.
Embora sem dados precisos sobre a quantidade de inscrições das primeiras edições, o cineasta destaca a evolução na produção ao longo dos anos. “Eu acredito que, no início, devia ter algo em torno de cem filmes inscritos. Hoje, a gente alcançou mais de 1.200 inscrições, porque a maneira de fazer filmes mudou muito. Agora, os filmes são feitos de forma digital. O custo dos equipamentos caiu muito. Se tornou mais barato e mais fácil fazer filmes. O volume de filmes que existe é muito maior”.
O diretor de programação do festival mais representativo do cinema ambiental do país seguiu destacando os desafios enfrentados para dar sustentabilidade ao evento durante esses 26 anos de história. “Tem uma quantidade muito grande de festivais que deixam de existir, porque é difícil você achar um lugar ao sol e se manter como uma referência em alguma área. Já o Fica tem conseguido fazer isso. Ele foi o primeiro festival brasileiro e um dos primeiros do mundo com esse recorte ambiental. E se mantém como um festival bastante reconhecido no Brasil, um festival ao qual as pessoas se referem de uma maneira muito positiva”.
Novaes teceu um relato pessoal de como a história do evento foi fundamental para a consolidação da cena audiovisual goiana e para a sua própria consolidação enquanto profissional da área. “Eu fui parte desse processo. Quando o Fica começou, eu estava começando a pensar em fazer filmes. A minha vida profissional, de várias maneiras, foi Influenciada e direcionado pelo festival, assim como a de muitos realizadores, muitos profissionais do audiovisual em Goiás”.
O cineasta finalizou registrando uma menção honrosa às contribuições legadas pelo jornalista Washington Novaes ao evento. O expoente do ambientalismo goiano faleceu em agosto de 2020, em Aparecida de Goiânia, aos 86 anos. “Meu pai desempenhou um papel importante desde a criação e implementação do Fica. Ele ajudou a construir essa história, como muitas outras pessoas também fizeram, e é um privilégio poder, de certa forma, dar continuidade, hoje, a esse legado”.
Em 2020, o deputado Talles Barreto, que era então integrante do PSDB e hoje está no União Brasil (UB), assinou propositura que diapiõe sobre a inclusão do nome do jornalista Washington Novaes na denominação do Fica. “A Alteração do nome do festival é uma forma justa de homenagear o grande homem que foi Washington Novaes, enaltecendo seu trabalho como jornalista e ambientalista defensor da natureza e do meio ambiente, e como consultor do maior festival do Estado de Goiás, o Fica, durante muitos anos”, defendeu o parlamentar, na ocasião.