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Campanha promove o diagnóstico precoce e combate o estigma relacionado ao transtorno do déficit de atenção e hiperatividade

23 de Outubro de 2025 às 09:00
Campanha promove o diagnóstico precoce e combate o estigma relacionado ao transtorno do déficit de atenção e hiperatividade

Imagine um computador com inúmeras abas na internet abertas simultaneamente. De repente, algumas travam, outras começam a tocar música sem que isso seja solicitado e, a que você realmente precisa, nunca carrega por completo. No impulso, você abre outra janela com mais cinco novas abas em sites diferentes. Essa é uma metáfora para descrever como pode funcionar a mente de uma pessoa com o transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).

O Outubro Laranja, campanha anual de conscientização sobre o TDAH, tem como objetivo impulsionar a divulgação de informações corretas, promover o diagnóstico precoce e combater o estigma e o preconceito relacionados à condição. 

Trata-se de uma mobilização internacional que é replicada no Brasil. No país, a primeira semana de agosto também é dedicada a chamar atenção para o tema, conforme definido tanto por lei federal quanto por norma estadual

Dados da Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA) indicam que o número de casos de TDAH varia entre aproximadamente 5% e 8% a nível mundial. Em um período de 20 anos, a prevalência subiu 4,1% em 20 anos, segundo pesquisas internacionais. Especialistas atribuem o aumento à maior compreensão do transtorno e à conscientização da sociedade, que tornaram a identificação dos casos mais recorrentes. 

O que é?

Conforme explica a psiquiatra Leika Sumi, o TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento (surge na infância, afeta a evolução neurológica e causa efeitos crônicos) caracterizado pela presença contínua e prejudicial de comportamentos desatentos, hiperativos e impulsivos. O diagnóstico é clínico, isto é, sem exames laboratoriais ou de imagem, e parte da análise aprofundada do histórico individual. As diretrizes para essa investigação, detalha Sumi, são definidas pelo DSM-5, a quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. 

“Os critérios exigem a presença de um padrão persistente que interfira no desenvolvimento ou no funcionamento da pessoa. Há a necessidade da existência de, no mínimo, seis dos 18 sintomas de desatenção e/ou hiperatividade e impulsividade no caso das crianças e, para adolescentes e adultos, cinco”, completa a psiquiatra.

Algumas características da hiperatividade e impulsividade elencadas no DSM-5 são: falar excessivamente, dificuldade em permanecer sentado, interromper ou se intrometer nos assuntos alheios e abandonar projetos antes da conclusão. Dificuldade para seguir instruções, perda recorrente de objetos importantes e fácil distração causada por qualquer estímulo são exemplos da desatenção. 

O TDAH tem três subtipos, os quais são determinados conforme a quantidade de manifestações encontradas em cada um dos pilares diagnósticos. Quando se verificam cinco/seis de desatenção, mas menos que isso de hiperatividade e impulsividade, o TDAH é predominantemente desatento. Analogamente, ele pode ser predominantemente hiperativo e impulsivo ou misto, quando há ao menos cinco/seis sinais de ambas as características. Segundo o Ministério da Saúde, a modalidade combinada corresponde a 55% dos casos. 

Os sinais, de acordo com as exigências do DSM-5, precisam ter aparecido antes dos 12 anos de idade, ocorrer em pelo menos dois âmbitos diferentes, como vida social e escola ou trabalho, e causar danos significativos nos contextos em que se apresentam.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) desenvolveu testes rápidos que podem ser o ponto de partida para a identificação do TDAH em adultos e crianças (confira aqui). Entretanto, é preciso destacar que os questionários são apenas o início do caminho para o diagnóstico, que só pode ser dado definitivamente por um profissional de saúde especializado. “O tratamento é multiprofissional e envolve, dentre outros, psicoterapia; medicamentos psicoestimulantes e mudanças de estilo de vida”, informa Leika Sumi.

Mais informação, menos julgamento 

Muitos indivíduos podem experienciar, eventualmente, um ou mais traços do TDAH (ver box abaixo). Todavia, quem convive com esse transtorno possui os sintomas de forma acentuada e duradoura, e eles geram prejuízos expressivos e obstáculos invisíveis em diferentes áreas da vida. 

É como comparar quem está triste com quem enfrenta um quadro de depressão. Relativizar essas diferenças contribui para disseminar informações falsas e para amplificar o estigma associado ao diagnóstico. 

Com informações da ABDA (Crédito da imagem: Seção de Mídias Digitais da Assembleia Legislativa de Goiás)

João Victor Ramos, de 25 anos, afirma que percebeu a sua agitação e inquietude incomuns ainda durante a primeira infância, apesar de o TDAH ter sido oficialmente identificado por um profissional de saúde apenas há pouco mais de um ano. “As consequências que tive por isso, principalmente no meio social, tornam tudo mais evidente e frustrante”, confessa. 

Ainda que o TDAH seja geralmente visto como um transtorno que se manifesta na infância, em alguns casos ele pode não ser percebido até a adolescência ou a vida adulta. As alterações neurológicas persistem após a maioridade e os sintomas comportamentais se mantêm nessa etapa da vida. Questões de gênero podem impactar no reconhecimento por especialistas.

O TDAH não tratado não é uma “adaptação natural”, é uma sobrecarga silenciosa sobre o indivíduo. A baixa autoestima e a evasão escolar são alguns dos possíveis resultados da falta de tratamento adequado, no caso das crianças e adolescentes. Para adultos, o cenário pode ter consequências como vícios, impacto na produtividade do trabalho, desregulação emocional e problemas de relacionamento.

Segundo João Victor Ramos, conviver com o transtorno é desgastante e impede que “fique em paz consigo mesmo”. Ele explica: “Eu quero fazer mil e uma coisas simultaneamente e não dou conta. Há também, por exemplo, uma imensa dificuldade de conseguir ficar quieto. E a desatenção é como se o meu corpo e a minha mente estivessem em lugares diferentes. Sempre sinto que estou perdendo tempo”. 

Em uma situação quase poética por sua ironia, a servidora da Agência de Notícias do Parlamento goiano responsável por esta matéria possui o TDAH predominantemente desatento. Entre os seus problemas mais significativos causados pelo transtorno, estão a dificuldade em gerir o tempo, planejar, organizar e realizar tarefas. Como resultado, grande parte desta publicação foi redigida no dia final do prazo de entrega.

No Parlamento 

O apoio às pessoas que possuem o TDAH é um dos assuntos que ganha destaque nas proposições apresentadas e ações de parlamentares da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego). 

Com o projeto de lei protocolado sob o nº 8036/21, Charles Bento (MDB) sugere assegurar o fornecimento, pela rede pública estadual de saúde e para as famílias comprovadamente carentes, dos medicamentos necessários ao tratamento do transtorno. Além disso, o deputado também pretende garantir o atendimento preferencial aos serviços de saúde ao público em questão. A matéria aguarda entrar em pauta durante uma sessão plenária para ser avaliada em sua segunda e última fase de votação. 

O deputado Cristóvão Tormin (PRD), no intuito de potencializar o acesso ao atendimento multidisciplinar aos que têm TDAH e/ou transtorno do espectro autista (TEA), pleiteia instituir a campanha estadual O Dia da Ação Azul, ideia que tramita na Casa de Leis como processo nº 18852/25

A iniciativa prevê a presença de profissionais nas áreas de fonoaudiologia, psicoterapia, terapia ocupacional, neurologia, odontologia e atendimentos jurídicos. De acordo com o texto, os especialistas deverão participar de forma voluntária. Além disso, a ação deverá ocorrer em espaços acessíveis e confortáveis, com atividades inclusivas que favoreçam o desenvolvimento social. 

“A realização do Dia da Ação Azul ocorrerá em municípios e entidades sem fins lucrativos, garantindo que as populações locais tenham acesso a diagnósticos mais rápidos e orientações especializadas, sendo um marco na promoção da inclusão social, no combate ao estigma e na sensibilização de toda a comunidade”, defende o parlamentar na justificativa. O texto está apto à votação em primeira etapa pelo Plenário. 

Enquanto isso, com a matéria nº 1538/20, Wilde Cambão (PSD) pleiteia proibir que unidades escolares e creches públicas, no momento da rematrícula, transfiram os estudantes com TDAH, TEA e dislexia para outras instituições sem a prévia comunicação e anuência dos responsáveis legais. 

O deputado pretende estabelecer, ainda, que a manutenção dos menores na unidade em que já estão matriculados deve ser priorizada. Quando a transferência for necessária, o aviso deve ser feito por escrito e com prazo de antecedência de no mínimo 30 dias do início das matrículas. O projeto também já pode ser incluído na Ordem do Dia para a primeira votação plenária. 

A Casa de Leis também se dedica ao tema por meio de ações, a exemplo do 1º Fórum de Mães Atípicas, promovido por Paulo Cezar Martins (PL) no último mês de maio, e da audiência pública, no mesmo mês e conduzida por Mauro Rubem (PT), que pautou os direitos de crianças atípicas seguradas por planos de saúde privados.

Agência Assembleia de Notícias
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