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Pela igualdade

20 de Novembro de 2023 às 08:40
Pela igualdade
Alego promove série de eventos que provocam reflexão sobre a história da população negra e sobre as desigualdades que persistem. Os deputados têm vários projetos que buscam a valorização das pessoas pretas.

Durante os quase 400 anos de escravidão no Brasil, os quilombos foram um símbolo de resistência e dignidade para a população negra. Localizados em áreas remotas, esses espaços serviam de refúgio para pessoas que conseguiam escapar do regime escravocrata.

O Quilombo dos Palmares, localizado entre os estados de Alagoas e Pernambuco, foi o maior e mais importante quilombo da história do Brasil. Liderado por Zumbi dos Palmares, o quilombo chegou a abrigar mais de 30 mil pessoas e resistiu por mais de 80 anos às investidas das forças escravagistas. A morte de Zumbi, em 20 de novembro de 1695, foi um duro golpe para a resistência negra. O líder quilombola foi assassinado em uma emboscada e sua cabeça foi decepada e exposta em praça pública, em Recife. O objetivo era amedrontar outras pessoas escravizadas que desejassem escapar.

Por conta disso, o 20 de novembro é celebrado no Brasil como o Dia da Consciência Negra, em homenagem a Zumbi dos Palmares. A data é uma oportunidade para refletir sobre a história da população negra no Brasil e sobre as desigualdades que ainda persistem. Apesar do fim da escravidão em 1888, a população negra ainda é a mais pobre do país. O racismo estrutural, cada vez mais estudado, impede que essas pessoas tenham pleno acesso a oportunidades de estudo, emprego e renda.

Deputados

O deputado Ricardo Quirino (Republicanos) diz que, quando se usa o termo “consciência negra”, é para que não se esqueça tudo que a população negra passou e ainda passa. “Existe, sim, discriminação, é uma população que ainda recebe baixos salários, ocupa funções geralmente bem inferiores no nosso país e no mundo e, infelizmente, ainda é vítima de um preconceito”, aponta o parlamentar.

Segundo ele, a maioria da população já deixou de ter preconceito contra a população negra, mas ainda existe uma pequena parcela que não conseguiu vencer isso. Ele é favor de que a data de 20 de novembro vire feriado, “desde que se dê liberdade para cada unidade da federação decida se é viável ou não”.

O deputado Cristiano Galindo (Solidariedade) vê a data como uma importante forma de preservação da identidade histórica e cultural do Brasil. Segundo ele, a possibilidade de “ser feriado vem para simbolizar a luta de quem sofreu com a escravidão, o racismo e a desigualdade, problemas que surgiram desde a construção do país e que vemos até os dias de hoje”. Galindo arremata: “Eu sou negro, apoio a discussão desta causa e estou à disposição da população, a fim de que possamos construir uma sociedade mais justa e igualitária”.

É da deputada Bia de Lima (PT) o projeto de lei nº 654/23, que institui o Dia da Consciência Negra como feriado estadual no Estado de Goiás. O projeto foi rejeitado em setembro na Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJ). Independentemente de ser ou não feriado, a parlamentar diz que comemorar o Dia da Consciência Negra é importante porque é preciso reconhecer a existência do racismo, para combatê-lo. "Há uma visão equivocada de que o Brasil é uma democracia racial. Isso é um mito... vivemos um racismo estrutural quase institucionalizado que corrói o tecido social e, se não reconhecermos isso, a sociedade não mudará.”

Bia lembra que as estatísticas nos mostram quem são as maiores vítimas de homicídios, violência de gênero, encarceramento, desigualdade de renda: mulheres e jovens negros. "O que é isso, senão consequência do racismo? Tenho certeza absoluta de que escamotear o racismo é aprofundá-lo. Portanto ao celebrarmos a liberdade conquistada pelos escravizados, é imperativo reconhecermos que essa emancipação não foi acompanhada da plenitude de direitos individuais e sociais, deixando uma lacuna significativa para essa parcela da população.”

A petista diz que, como pessoa, professora e legisladora, se sente com responsabilidade de enfrentar as situações conforme elas se apresentam e buscar formas e medidas para solucioná-las.

Talles Barreto (UB) diz que o 20 de novembro é uma data que marca a luta do povo negro, devendo ser lembrada e comemorada por todos nós. Apesar de já existirem muitos feriados nacionais, afirma ele, esta é uma data que merece destaque diante da nossa história. Talles diz que se considera pardo e reconhece as lutas que foram e são travadas pelos negros até os dias de hoje.

O deputado Virmondes Cruvinel (UB) diz que o Dia da Consciência Negra traz uma reflexão histórica fundamental: a sociedade brasileira terá sempre o dever humanista de relembrar o sofrimento do povo negro durante a estupidez da escravidão. O deputado diz que a data serve para reforçar a luta por igualdade racial e por reparação histórica via políticas afirmativas. Mas também deve ser um momento de comemoração, de festa, para celebrar as conquistas e curtir toda a beleza e riqueza da cultura afro-brasileira. “Por isso, creio que o feriado é oportuno, tanto para a reflexão quanto para a comemoração”, arremata.

O deputado Amilton Filho (MDB) diz que o dia 20 de novembro é um marco como a verdadeira data de luta e emancipação da população negra, sendo um momento essencial para levarmos dois pontos à reflexão. O primeiro, segundo ele, é o protagonismo da história de luta e resiliência que povos negros possuem não só no País como em também no nosso Estado - em especial no Nordeste goiano. O segundo diz respeito ao preconceito, ao racismo estrutural e aos espaços de poder que as pessoas negras poderiam estar ocupando em nossa sociedade hoje. No entanto, Amilton não é a favor que a data se torne um feriado nacional. “Datas como o Outubro Rosa e o Novembro Azul exercem uma grande função de conscientização e nem por isso são feriados. O que precisamos é de ações efetivas de reflexão”, pontua.

O deputado Mauro Rubem (PT) lembra que o Brasil foi o último país do Ocidente a abolir a escravidão. “Aquele sistema de exploração e degradação humana que dava muito lucro para as classes dominantes que pagavam pelos negros africanos traficados que eram trazidos à força e, desumanizados, eram tratados como objetos que davam lucro, tanto pela exploração do trabalho forçado como pelo próprio comércio de seres humanos.”

Mauro diz que é preciso desmistificar o processo de abolição no Brasil até a publicação da Lei Áurea, que foi marcado por muitas lutas, muito sangue derramado, dos escravizados e dos libertos, que lutaram por meio de insurreições, rebeliões e também com muita pressão social de setores da classe média e de profissionais liberais, muito diferente da visão romantizada sobre a benevolência da princesa Isabel que assinou a Lei Áurea em 1888.

Segundo o petista, foram mais de 300 anos de exploração e uma “libertação” sem qualquer preocupação das classes dominantes em incluir essa massa gigantesca de “ex-escravos” para que pudessem conquistar as condições mínimas de terem acesso à moradia, saúde, educação e se estruturarem. “Então, tudo isso acontecia há apenas 135 anos e hoje o que vemos é o resultado desse processo de naturalização do horror e da exclusão, como se a escravidão fosse benéfica, ordeira, tranquila, legal; e como se a exclusão daquela época não tivesse seguido ao longo dos anos e não tivesse consequências nos dias de hoje”, complementa.

Mauro assinala que o Brasil é um País profundamente desigual quando se compara os marcadores sociais e constata-se que a raça é sempre um agravante para a raça negra e um atenuante para a raça branca. “Pelo próprio censo oficial do governo, verificamos que a população negra tem menos acesso à educação, moradia e saúde. Eles morrem mais jovens e são a maioria esmagadora nos presídios. E tudo isso é resultado do processo a que essas populações foram submetidas em nosso País”, lamenta.

O parlamentar diz que é preciso parar de reproduzir o pensamento atrasado do Brasil escravagista, racista, violento e excludente com as populações negras e rejeita o discurso da meritocracia pura. Segundo ele, não se pode falar em meritocracia num universo tão desigual, por isso a importância de resgatarmos a dívida histórica desse País por meio de políticas afirmativas e inclusivas para com a população negra. "Por isso, precisamos lembrar e tornar feriado o dia 20 de novembro como o dia da Consciência Negra, para refletirmos sobre o papel social e humano que cabe a cada cidadão brasileiro e ao Brasil, como uma nação que conhece e respeita a própria história e que faça a opção pela justiça social, econômica, étnica, religiosa e cultural.”

Projetos

De autoria do deputado Dr. George Morais (PDT), já foi aprovado em dois turnos em setembro o projeto de lei nº 992/23, que institui a Política Estadual de Combate ao Racismo no Esporte. A intenção é realizar mensagens informativas, com intuito de expressar e conscientizar a população contra a prática de racismo no espaço esportivo.

O objetivo da matéria é estabelecer que os promotores de eventos esportivos veiculem, durante sua realização, mensagens informativas da tipificação penal do racismo e de sua qualificadora se a conduta for praticada no contexto das atividades esportivas. De acordo com o deputado, “as mensagens educativas serão veiculadas ao público por meio de material impresso ou de recurso audiovisual, devendo constar em ingressos, flyers, outdoors ou quaisquer outros meios de publicidade, bem como no local dos eventos, em lugar de fácil visualização".

George Morais ressalta que o descumprimento das prescrições do artigo 4° implicará multa de até R$ 500 reais, duplicando-se o valor em caso de reincidência. Ele ressalta ainda que a alteração da Lei n° 7.716, de 1989, está em favor de qualificar o racismo no contexto das atividades esportivas, devido aos acontecimentos recentes nos estádios de futebol, o que demonstra a urgência de combater essas condutas, bem como a importância do presente projeto de lei.

De autoria do deputado Clécio Alves (Republicanos), foi também aprovado em dois turnos um projeto de lei que institui a Política Estadual Vini Júnior de combate ao racismo nos estádios e nas arenas esportivas goianas, buscando transformá-los em ambientes acolhedores para toda a comunidade esportiva. Protocolada com o nº 925/23, a matéria ressalta o caso recente do jogador brasileiro Vinícius Júnior, do Real Madrid (Espanha), que sofreu atos racistas durante uma partida do campeonato espanhol por torcedores rivais, fato reincidente que ganhou repercussão mundial, incluindo declarações de solidariedade de diversos líderes.

Segundo observa, o racismo ocorre, geralmente, nos estádios, por parte de torcidas organizadas, que dirigem insultos raciais, gestos ofensivos e outros comportamentos discriminatórios contra jogadores ou torcedores de origens étnicas diferentes. “Esse tipo de comportamento é inaceitável e vai contra os princípios de igualdade, inclusão e respeito mútuo. O racismo nos estádios de futebol não apenas prejudica as pessoas diretamente afetadas, mas também mancha a reputação do esporte e cria um ambiente hostil para os fãs que simplesmente desejam desfrutar do jogo”, aponta Clécio.

Está na CCJ a propositura de nº 925/22, que visa instituir diretrizes para campanha permanente de combate ao racismo nas escolas e eventos esportivos e/ou culturais. A matéria é de autoria do deputado Karlos Cabral (PSB) e foi relatada pelo deputado Amilton Filho (MDB).

De acordo com o projeto, a campanha permanente terá como objetivos principais os seguintes: a proposição de atividades aos alunos, visando o combate ao racismo, por meio da informação e devido respeito às raças, etnias, religiões e povos tradicionais; e a conscientização sobre a importância da igualdade para que haja o enfrentamento do racismo nas escolas públicas e privadas, bem como nos eventos esportivos e culturais.

Conforme justificativa da propositura, dentre muitas instituições sociais, a escola não está isenta dos efeitos do racismo. “Vivemos uma nova lógica social com a qual a sociedade precisa se comprometer e, para isso, são necessárias campanhas que objetivem levar os estudantes, bem como a sociedade em geral, a compreenderem o processo de formação étnico-cultural do Brasil”, frisa Karlos Cabral.

De autoria do Poder Executivo, está apto para apreciação em plenário um projeto de lei que visa a instituir, no Estado, o Pacto Goiás Sem Racismo. A matéria, de n° 6145/23, deve ser apreciada, em primeira fase de votação, em breve. A iniciativa cria um comitê gestor estadual de enfrentamento ao preconceito em Goiás. A ideia é promover a igualdade racial e combater as práticas do racismo, da injúria racial e da intolerância religiosa.

A proposta decorre, segundo o documento, de uma iniciativa da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Seds). A pasta esclarece que, caso a matéria prospere, o conselho em questão será composto por representantes titulares e convidados de órgãos e entidades públicas estaduais e civis. "As ações de combate a qualquer tipo de discriminação, previstas no atual Plano de Governo do Estado de Goiás, são compromissos desta gestão", diz um trecho do documento enviado ao Legislativo. E continua:  "exemplos disso são a promoção da campanha estadual Aluno Consciente e a manutenção da Política Estadual de Combate ao Racismo no Esporte".

Estão entre as diretrizes do Pacto Goiás sem Racismo o enfrentamento ao racismo estrutural e toda forma de violência baseada na discriminação; a igualdade de acesso às políticas públicas; o combate ao racismo no mercado de trabalho; a geração de dados estatísticos, indicadores demográficos e mapeamentos referentes à população negra, dentre outros. 

Uma matéria que dialoga com o tema em destaque – e está arquivada, mas pode ser reapresentada por qualquer parlamentar da atual legislatura – é o processo nº 7231/21, de autoria da ex-deputada estadual (e atual deputada federal) Lêda Borges (PSDB). A proposta estipula medidas de combate ao racismo estrutural, ao obrigar os estabelecimentos comerciais a comunicarem às autoridades policiais a ocorrência de prática de constrangimento público, abuso de autoridade, violência física ou psicológica, assédio moral, ou qualquer conduta que configure discriminação em função da cor, gênero, religião ou idade em suas dependências, especialmente os praticados por equipes responsáveis pela segurança do local. O projeto visa evitar eventos truculentos como os que levaram à morte, por espancamento, de um homem negro em um supermercado da rede Carrefour, na cidade de Porto Alegre (RS). João Alberto Silveira Freitas, de 40 anos, foi morto, às vésperas do Dia da Consciência Negra, em novembro de 2021, por dois agentes brancos que faziam a segurança do estabelecimento. 

Um projeto, avizinhado do tema, que virou a Lei Estadual nº 21.981 foi o de nº 7233/21, do ex-deputado estadual (atual deputado federal) Jeferson Rodrigues (Republicanos). A matéria instituiu o “Dia Estadual da Liberdade Religiosa”, a ser celebrado, anualmente, em 25 de maio. A data relembra o assassinato do afro-americano George Floyd, no ano passado. Ele foi vítima de estrangulamento por um policial branco, após ser acusado de usar uma nota falsificada de 20 dólares em um supermercado de Minneapolis, nos EUA. O evento originou protestos contra o racismo em vários países. 

Atividades

Exposição, performance poética e show musical abriram a temporada de atividades em celebração ao Mês da Consciência Negra, no Parlamento goiano, na quarta-feira, 8 de novembro, por iniciativa da Seção de Atividades Culturais da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego). A ideia é colaborar com a reflexão sobre o racismo e suas consequências.

Entre outros, houve performance poética e  teatral da artista Aridan, que declamou poemas com temáticas voltadas para a negação e repressão da cultura negra, da exploração sexual dos corpos negros e do racismo em geral e abertura da exposição “Deusas da Justiça”, do artista plástico Elson Nascimento, que segue no saguão principal do Palácio Maguito Vilela até o dia 30. São 13 telas que retratam mulheres negras representando Têmis ou Thémis, que é a deusa da justiça na mitologia grega. Nascimento começou a pintar as “Deusas da Justiça” há quatro anos, para uma exposição no Tribunal de Justiça de Goiás. As telas agradaram tanto que ele não parou mais. Para a mostra na Alego, as “deusas” são todas negras, para despertar a reflexão acerca do tema do racismo.

A deputada Bia de Lima ajudou a promover uma série de atividades em comemoração ao Dia da Consciência Negra. Nos dias 20 e 21, durante todo o dia, empreendedores negros realizarão a Feira Preta, com a comercialização de vestuários, acessórios, bijuterias e doces da cultura afro. Nesses dias também será realizado workshop sobre diversidade capilar.

Dia 21, alunos de escolas públicas que aplicam a Lei nº 10.639/2003 vão promover, às 14 horas, na explanada da Alego, o já tradicional Abraço Negro, que traz o tema Racismo e Comunicação. O projeto, iniciado há 23 anos, na Escola Municipal Evangelina Pereira da Costa, na Chácara Recreio São Joaquim e hoje realizado em diversos municípios goianos por meio das regionais sindicais do Sintego, e ainda em Minas Gerais, Distrito Federal, São Paulo e Bahia.  A Lei nº 10.639/2003 torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileiras nas escolas públicas e privadas de todo o País.

Ainda no dia 21, Bia de Lima promove, às 19 horas, no Plenário Iris Rezende, uma sessão solene que homenageará ativistas do movimento negro com o Certificado Glória Maria, jornalista que morreu há nove meses e que muito contribuiu na luta antirracista.

Agência Assembleia de Notícias
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