Direito de informar
Nesta sexta-feira, 3, em que é celebrado o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, o Brasil tem a comemorar um ganho de dez posições no ranking da organização internacional Repórteres Sem Fronteiras (RSF), que mensura essa liberdade e acaba de ser divulgado.
O País subiu, entre 2023 e 2024, da 92ª posição para a 82ª do ranking, embora permaneça entre aqueles de situação “problemática” em relação à liberdade de imprensa. Avançou, de todo modo, 28 posições em relação a 2022, quando estava em 110º lugar.
O relatório atribui tal avanço a uma “normalização das relações entre as organizações estatais e a imprensa”, mas pondera que “a violência estrutural contra jornalistas, um cenário midiático marcado pela alta concentração privada e o peso da desinformação representam desafios significativos para o avanço da liberdade de imprensa no País”.
Na última década, o Brasil foi o segundo país das Américas em jornalistas mortos, 30 ao total, ficando atrás somente do México, com exatos cem profissionais assassinados.
O ranking abrange 180 países, e apenas 25% deles apresentam situação considerada “boa” (caso de oito países) ou “relativamente boa” (37) em relação à liberdade de imprensa.
A liderança é pelo oitavo ano consecutivo da Noruega. A Rússia, que perdeu posições desde o início da ofensiva contra a Ucrânia, está na 162ª colocação. “Quase todos os meios de comunicação independentes foram banidos, bloqueados e/ou declarados ‘agentes estrangeiros’ ou ‘organizações indesejadas’. Todos os outros estão sujeitos à censura militar”, escreve a RSF sobre o contexto russo. A Ucrânia está na 61ª colocação.
Israel também caiu no ranking e está na 101ª posição. Desde o começo da guerra em Gaza, em 7 de outubro de 2023, aponta a RSF, mais de uma centena de jornalistas foram mortos nas mãos do exército israelense no enclave palestino. A Palestina, justamente por ser o cenário dessas mortes, além de inúmeras detenções, está em 157º lugar.
Nos Estados Unidos, que caíram dez posições, ficando em 55ª, há “crescente desconfiança nos meios de comunicação, alimentada especialmente pela hostilidade aberta dos líderes políticos, alguns dos quais não hesitam em pedir a prisão de jornalistas. Em diversas ocasiões, agentes policiais locais revistaram indevidamente redações e prenderam jornalistas”.
O Peru é um dos piores casos das Américas, com as condições para a prática do jornalismo “se deteriorando à medida que o sistema político se torna cada vez mais opaco”, e, como resultado, a queda de 48 posições em dois anos, colocando o país em 125º no mundo em liberdade de imprensa.
No Dia do Jornalista, comemorado a cada 7 de abril, a Agência Assembleia de Notícias esmiuçou outros números relativos à liberdade de imprensa e à violência contra jornalistas, tanto de âmbito global quanto referentes às regiões brasileiras. Depois de três anos como a região com mais violência contra jornalistas, o Centro-Oeste está hoje na terceira posição.
Ponto focal
No Brasil, o atual ponto focal das discussões sobre liberdade de imprensa se concentra nas questões de liberdade, responsabilidade e transparência na internet, tema do projeto da Lei Federal no 2630/20. Depois de provocar grandes debates, o projeto não será votado em Plenário, anunciou o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) no início de abril, anunciando a criação de um grupo de trabalho para debater um novo projeto de regulação das redes sociais.
O projeto no 2630/23, afirmou o presidente da Câmara, foi “alvo de narrativas de propor censura e violação da liberdade de expressão”, o que prejudica sua análise, além de não haver consenso entre os deputados para a votação.
Trata-se de uma proposição extensa, com 36 artigos.
O art. 6º, na seção de disposições gerais, versa, por exemplo, que “com o objetivo de proteger a liberdade de expressão e o acesso à informação e fomentar o livre fluxo de ideias na internet, os provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada, no âmbito e nos limites técnicos de seu serviço, devem adotar medidas para: I – vedar o funcionamento de contas inautênticas; II – vedar contas automatizadas não identificadas como tal, entendidas como aquelas cujo caráter automatizado não foi comunicado ao provedor de aplicação e, publicamente, aos usuários; e III – identificar todos os conteúdos impulsionados e publicitários cuja distribuição tenha sido realizada mediante pagamento ao provedor de redes sociais”.
É explícito que essas vedações “não implicarão restrição à manifestação artística, intelectual ou de conteúdo satírico, religioso, político, ficcional ou literário, ou a qualquer outra forma de manifestação cultural, nos termos dos arts. 5º, inciso IX, e 220 da Constituição Federal”.
Buscava-se identificar, em caso de denúncias, os responsáveis pelas contas, prevendo o art. 7º que “os provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada poderão requerer dos usuários e responsáveis pelas contas, em caso de denúncias por desrespeito a esta Lei, no caso de indícios de contas automatizadas não identificadas como tal, de indícios de contas inautênticas ou ainda nos casos de ordem judicial, que confirmem sua identificação, inclusive por meio da apresentação de documento de identidade válido”.
Outras preocupações eram as de “limitar o número de encaminhamentos de uma mesma mensagem a usuários ou grupos, bem como o número máximo de membros por grupo” (art. 9º, II) e “instituir mecanismo para aferir consentimento prévio do usuário para inclusão em grupos de mensagens, listas de transmissão ou mecanismos equivalentes de encaminhamento de mensagens para múltiplos destinatários” (art. 9º, III).
O projeto na íntegra pode ser conferido aqui.
Liberdade e sustentabilidade
Ao falar sobre o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa em discurso nesta quinta-feira, 2, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, focou no tema da emergência ambiental. “Os meios de comunicação locais, nacionais e mundiais podem dar visibilidade a histórias sobre a crise climática, a perda de biodiversidade e a injustiça ambiental”, disse.
“A liberdade dos meios de comunicação social está sitiada. E o jornalismo ambiental é uma profissão cada vez mais perigosa”, prosseguiu. “Dezenas de jornalistas que cobriam a mineração ilegal, a exploração madeireira, a caça furtiva e outras questões ambientais foram mortos nas últimas décadas. Na maioria dos casos, ninguém foi responsabilizado”.
O secretário-geral pontua ainda que, conforme relato da Unesco, nos últimos quinze anos, ocorreram cerca de 750 ataques a jornalistas e meios de comunicação que informavam sobre questões ambientais, e a frequência desses ataques vem aumentando.
Guterres também chamou a atenção para o elevado número de mortes de jornalistas em Gaza e sustentou que “uma imprensa livre não é uma escolha, mas uma necessidade”.